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March 17, 2021

Campos de Concentração no Brasil

 


Você sabia que, antes da Alemanha nazista, o Brasil teve os seus campos de concentração? Na grande seca que assolou o nordeste brasileiro em 1915, alguns campos de concentração foram criados no Ceará, próximos à capital Fortaleza, com o objetivo de impedir o povo pobre que, fugindo da seca, tentava chegar à capital. Raquel de Queiroz escreveu sobre esta seca no livro “O Quinze” e mencionou os campos de concentração. As pessoas eram vestidas com sacos de farinha, tinham seus cabelos raspados e viviam em condições precárias, amontoadas em casarões. Muitos morriam de fome, de sede e de doenças. Na grande seca de 1932, mais sete campos de concentração foram espalhados pelo estado, nas rotas de chegada à capital, impedindo assim o acesso das pessoas à cidade. Nota-se que a solução dada pelos governantes da época foi péssima, desumana.
Se retrocedermos 400 anos na história, vamos encontrar uma situação social parecida na cidade de Genebra, na Suíça. Entre 1550 e 1560 a população da cidade saltou de 13.100 para 21.400 habitantes por causa do enorme contingente de refugiados vindos de países da Europa, fugindo da perseguição católico-romana. Essa multidão de famílias chegava e não havia trabalho e nem estrutura para eles. Na época, Deus usou um pastor chamado João Calvino para criar condições de abrigo e trabalho a estas famílias. Calvino instituiu, em 1541, o Diaconato para o cuidado dos pobres e dos doentes. Os recursos vinham de doações do próprio povo, suplementadas pelo estado. Houve esforços em empregar os refugiados. Aqueles que não achavam emprego em sua profissão iam trabalhar provisoriamente na construção das fortificações da cidade. Em 29 de dezembro de 1545 Calvino interveio junto ao Pequeno Conselho para que fosse desenvolvida a indústria de tecelagem a fim de gerar empregos aos refugiados. Não houve campo de concentração em Genebra. O problema foi solucionado com caridade e compaixão.
Vez por outra a humanidade dá mostras de sua degeneração. O limite da maldade sobe a níveis perturbadores. Foi assim nos dias anteriores ao dilúvio, nas cidades de Sodoma e Gomorra e, mais recentemente, nos genocídios da Armênia, União Soviética, Alemanha, entre outros. Os campos de concentração no Nordeste do Brasil também revelaram esta maldade. Por outro lado, sempre que os princípios do Evangelho são aplicados nas calamidades sociais, o resultado é a preservação das vidas. Nas pestes que assolaram a Europa, por exemplo, os cristãos foram aqueles que cuidaram dos doentes e ajudaram os necessitados.

Em tempos de pandemia, como o que estamos vivendo, os cristãos têm a oportunidade de consolar os que choram, cuidar dos que estão acamados, ajudar financeiramente os que estão sem trabalho e anunciar que a verdadeira salvação está em Jesus Cristo, a nossa esperança. Os cristãos sempre fizeram a diferença em calamidades sociais. Não abandonemos este legado. Que Deus nos abençoe.

June 24, 2020

Cybergnosticismo - Os Guinness

REAL, BOBINA[i] OU VIRTUALMENTE REAL?




Em dezembro de 1993 um jovem estudante universitário da Virgínia cochilou sobre o volante de seu carro enquanto dirigia pela Rodovia 17. Ele desviou em direção a um caminhão e morreu instantaneamente. De quem era a culpa? Do álcool? Drogas? Pressão do trabalho? Problemas de saúde? Nada disso. Ele simplesmente ficou sem dormir por quase uma semana em sua paixão por entrar no mundo da “AmberMUSH”, uma rede de computadores multiuso dedicada aos jogos de interpretação de papeis[ii].

Na vida real o jovem da Virgínia era estranho, tímido, com suas notas do ensino médio nada espetaculares. Mas online era diferente, como qualquer outro poderia ser – uma desejável porém traiçoeira, manipuladora mulher das ruas chamada Sabbath. Sempre um alvo de provocações e intimidações enquanto crescia, ele tornou-se um consumado “garoto dos jogos”, para quem estar online era um escape da própria existência. Então, como os familiares e amigos disseram depois, o mundo da fantasia e das interpretações tornou-se tão real que ele quase desistiu da vida real e mudou-se para o cyberespaço. Finalmente, a última fase tornou-se a última fase.

PESSOA-A-PESSOA NÃO É CARA-A-CARA
Não podemos fazer grandes generalizações de uma tragédia pessoal como esta. Mas um tema recorrente emergiu das muitas respostas à notícia de sua morte. Parte do apelo da cybercomunicação é que ela é de pessoa-a-pessoa, mas não cara-a-cara. Embora sua capacidade coletiva de ilusão exija muitas habilidades de interpretação de papeis e regras bem desenvolvidas de conduta online, dá licença para a livre expressão da imaginação e emoção, enquanto preserva a privacidade.

O desenvolvedor do programa “AmberMUSH” explicou seu apelo: tais sistemas dão aos usuários “uma chance de pisar fora das fronteiras normais dos limites sociais...Idade, gênero, pano de fundo econômico, preferência sexual, contexto étnico e crenças políticas são completamente irrelevantes...Você pode confiar em estranhos simpáticos com a confiança do completo anonimato. Você pode questionar coisas a que foi ensinado sem ser tratado como algum tipo de excêntrico. Pode ouvir opiniões de tipos que não conheceria de outro modo, pessoas de fora da sua localidade geográfica, envolvidas em trabalhos ou passatempos dos quais você nunca ouviu falar.”

Preocupações sobre o cyberespaço e a nova informação super-rápida estão cercados por um redemoinho de propaganda exagerada e ansiedade, afirmações utópicas ingênuas e premonições obscuras de pessoas avessas à tecnologia. Mas uma coisa é inegável: os últimos desenvolvimentos em tecnologia da comunicação têm implicações desafiadoras à nossa experiência e entendimento da verdade e da personalidade humana. Como tais eles representam outra pressão moderna poderosa pesando sobre a mente cristã.

Se um passado serve como algum guia, o resultado da revolução do computador provavelmente estará em algum lugar entre os otimistas e os pessimistas. No presente momento os cyberentusiastas estão com toda a força, com o Vice-Presidente Gore em baixa. Estas novas tecnologias da comunicação como vídeo-telefones, dizem, irão ajudar a “consertar a família.” Os novos estilos de vida que surgem, como o teletrabalho, irão “restaurar o sentido perdido de comunidade.” As novas ferramentas da comunicação, eles nos anunciam com impassível seriedade, farão da vida humana mais humana.

É difícil, contudo, ficar impressionado. A revolução da televisão foi anunciada com a mesma fanfarra. Os comerciais de televisão, como foi predito nos anos 40, “fortaleceriam os laços familiares” e fariam com que as “cidades se tornassem desnecessárias.” Permitiriam que a alta cultura e as artes permeassem o todo da sociedade. Promoveriam um povo democrático com uma “elevação cultural” além do alcance de qualquer pessoa no passado abaixo da elite. Acima de tudo, com tem sido dito sobre novas tecnologias há 200 anos, tornariam possível o sonho mágico da “sociedade do lazer.”

Aparelhos de TV interativos, filmes sob demanda, vídeo games, base de dados, programação educacional, compras de casa, serviços de banco telefônicos, realidade virtual de todos os tipos – os cybergurus jorram todas as maravilhas dos novos serviços de informação para o povo comum. Mas é difícil escapar de algumas suspeitas fundamentais – de que teremos ainda menos lazer do que antes, de que muitas pessoas terão uma ansiedade ainda maior devido à alta complexidade, e de que o nível popular de pedidos (por alguma vaga de emprego ou estudo) testemunhará mais lixo cultural do que excelência.

Em resumo, o que o equipamento torna possível, o programa tornará real. E os sinais são de que programas comercialmente viáveis não trarão – para dizer caridosamente – nenhum aumento na excelência do nível artístico e intelectual do que a mediocridade da televisão durante os últimos cinquenta anos. A união frutífera entre alta tecnologia e a podridão da “cultura idiota” não parece que verá um divórcio tão cedo.

O ESPERANTO DE NOSSOS TEMPOS

Talvez os desafios mais difíceis à mente cristã venham das ferramentas e estilos da “realidade virtual.” Antes restrita a jogos de entretenimento, as tecnologias de realidade virtual constituirão uma nova forma de experiência humana – “um pulo ao espaço eletrônico”, como seus proponentes modestamente alegam.

A tecnologia da realidade virtual (ou RV) ainda está em um estágio rudimentar, mas os seus apaixonados ficam sem ar diante de suas capacidades divinas – a verossimilhança da simulação, a total imersão do meio-ambiente, e a quase-onisciência do “hipertexto” e seu potencial para interpretar qualquer texto. Se a tradição medieval tratava-se sobre o pensamento humano reduzido ao raciocínio lógico, a comunicação via modem é a experiência e o conhecimento humanos reduzidos ao processamento de informação. O cálculo da informação digital é o esperanto de nossos tempos – ou o mais próximo que podemos chegar dele. Nós podemos até não falar a mesma língua, mas um cálculo universal pode trazer todas as línguas a uma única e compartilhada base de dados.

Como um crítico afirmou, o conhecimento humano se aproxima da “cognição intuitiva e onisciente da divindade.” Nenhum desdobramento temporal, nenhum passo linear, nenhum atraso – as últimas tecnologias trazem até nós o limite do tudo-ao-mesmo-tempo do instante, uma informação total com uma simulação semelhante à dos deuses.

Seria a nova cybertecnologia simplesmente uma ferramenta ou uma ameaça à nossa humanidade? Seria o nosso moderno caso de amor com computadores meramente uma questão de fascinação intelectual? Ou seria, como alguns têm dito, erótica – uma procura profundamente espiritual e sensual por um lar para nossa mente e coração? Representaria o cyberespaço um avanço da mente ao custo do corpo – até ao ponto onde o corpo é opcional – até chegar a um novo gnosticismo? Seria importante o fato de que a “telepresença” mediada pela máquina e a “comunidade online” sejam desprovidas do imediatismo e da responsabilidade do compartilhamento linear cara-a-cara?

Somente o tempo responderá a estas questões, mas minha principal preocupação pelo impacto do cyberespaço no pensamento cristão é sobre os temas da verdade e da realidade. Tecnicamente, “realidade virtual” significa um evento ou experiência que é real em efeito mas não de fato. Realidade virtual, em outras palavras, é um mundo tecnológico humanamente construído que combina duas coisas: um alto nível de realismo em simulação e um alto nível de interação que resulta em uma total imersão. Assim, o termo “realidade virtual” foi escolhido pelos seus inventores – e evitado pelos seus críticos – devido a sua promessa metafísica poderosa. Realidade virtual é o Santo Graal do poder criativo da tecnologia.

“Isso é real ou é uma bobina?”. Esta pergunta, de uma geração atrás, tinha a intenção de ajudar crianças a distinguir fatos da fantasia na televisão e, assim, torná-las “alfabetizadas” em assistir à televisão. O poder da realidade virtual suspende todas estas questões e leva-nos a outro mundo. Realidade virtual, hoje, ainda está em um nível cru, mas a promessa de seu progresso leva-nos a um nível mais alto – próximo ao que Richard Wagner tinha em mente com seu conceito de “obra de arte total” no Festival Bayreuth.

Quando Wagner terminou sua última ópera, Parsifal, não a via simplesmente como ópera, ou música, teatro ou arte – e certamente não como “entretenimento.” Ele rivalizava com a ala do alto-catolicismo e sua missa. Ele estava criando uma realidade artificial que pudesse se tornar uma experiência total, que transformasse a realidade e a experiência ordinárias. O propósito final era nada menos que religioso.

A realidade virtual de hoje é um grito distante da alta arte de Wagner – graças a Deus, pois os comícios de Hitler em Nuremberg imitavam Wagner tão astutamente quanto qualquer um. Sem dúvida a realidade virtual, no futuro, alcançará suas próprias simulações de Bayreuth. Sem dúvida o caminho será bagunçado com simulações mais toscas, mais triviais, e menos pretensiosas. Mas a tendência geral é provavelmente a de minar o status da realidade e da verdade. Fantasias pessoais, estórias, romances e filmes já nos movem de uma dimensão da realidade a outra – e de maneira muito apropriada. Mas a mudança representada pela realidade virtual é um salto quântico à artificialidade e ao relativismo, um grande desafio da finitude e decadência da realidade como observadas na visão cristã do mundo.

MANTENDO VIRTUAL A REALIDADE VIRTUAL

Como podemos manter virtual a realidade virtual? Seria possível que as tecnologias do amanhã nos permitirão escapar da coleira da realidade mundana o suficiente para criar a ilusão de uma realidade além do que é real? O cybergnosticismo seria o resultado de tais voos imaginários, pois a experiência última de RV do futuro terá como objetivo ser espiritualmente sublime. Sem dúvida, podemos esperar que as sujas, mas altamente imaginativas seções de comércio cristão produzam não apenas “A Batalha do Armagedon em RV” mas também “Conversões Virtuais”, “Tempos de Quietude Virtuais”, “Experiências Místicas Virtuais”, e “Grupos de Recuperação Virtuais online”.

O principal objetivo do desenvolvimento da realidade virtual traz profundas questões filosóficas e religiosas. Como Michael Heim alerta, “Uma proliferação irrestrita de mundos clamam por sanidade, por conexão com a realidade, por alicerce metafísico.” Mas o objetivo menor terá o maior impacto. A visão bíblica da realidade é gloriosamente realística – vida humana das cinzas vivida na forma de sangue, suor e lágrimas.

Já podemos esperar pelos cybercorpos da realidade virtual do amanhã serem capazes de sofrer as desordens esperadas que são os avanços no fuso horário de hoje e as doenças de simulador. A realidade cristã será, então, o último melhor conferidor de realidade de sistemas de realidade virtual. Mas isto se os cristãos ainda forem moldados pela verdade decisivamente diferente na qual acreditamos. O reino mágico do “cristianismo virtual” pode ter um mercado, mas não tem futuro.

O ALARME DE INCÊNDIO E O INCENDIÁRIO

Como enfatizei no início da Segunda Parte, esta breve pesquisa sobre oito pressões culturais não é exaustiva. Muitas outras pressões poderiam ser citadas – por exemplo, a influência da psicologia em um nível popular (o “triunfo da terapia” de Philip Rieff). Ninguém deveria formar conclusões falsas destes alertas.

Uma falsa conclusão é que eu preciso me opor a qualquer ou a todas estas coisas – televisão, comerciais, estilo, programas de auditório, conversas sobre gerações, realidade virtual, pós-modernismo, psicologia e assim por diante. Como Marshall McLuhan dizia, “Me sinto como um homem que dispara o alarme de incêndio, mas acaba sendo acusado de incêndio culposo.” As descrições de McLuhan dos efeitos da tecnologia, em outras palavras, inclinaram pessoas – erradamente – a tomá-lo como inimigo das coisas que descrevia. A mesma coisa acontece aqui. Eu me oponho apenas aos efeitos negativos destas coisas. A modernidade, contudo, é uma espada de dois gumes e eu poderia facilmente escrever sobre seus benefícios em vez de seus custos.

Uma segunda falsa conclusão é que qualquer crítico destas tendências, eu incluso, poderia facilmente resistir às próprias tendências. Nunca é tão fácil. Mesmo Norman Mailer, lamentando o destino de romances sérios, admitiu recentemente que “muitos poucos” de seus nove filhos “são mais engajados com meu trabalho do que o são com as pessoas da televisão.” Ele confessou que tem se rebaixado ao suborno a seu filho mais novo, para que leia dez romances, ao prometer duas horas diárias de televisão se ele o fizer – algo não satisfatoriamente bem sucedido.

Uma terceira falsa conclusão é que estas pressões são abstratas e sem consequência – muito intelectuais e remotas para fazer qualquer diferença. Longe disso. Nós já temos examinado o escândalo e o pecado – a ineficácia evangélica na vida pública, por exemplo. Deixe-me adicionar aqui uma outra consequência: a crescente degradação do pensamento cristão à especulação, heresia, blasfêmia e o comportamento estranho.

Muitos evangélicos ficaram chocados e enfurecidos com o evento “Re-Imaginando”, uma “Conferência Teológica Global de Mulheres”, que aconteceu em Minneapolis em 1993. Apresentações ridicularizando a ortodoxia e negando a expiação de Jesus Cristo, aplausos efusivos a lésbicas, um culto com leite e mel à deusa Sofia – o que sobrou do “protestantismo principal” ostentava algumas das heresias mais vis já criadas na igreja de Cristo em dois mil anos.

Ainda assim, o que muitos evangélicos falham em reconhecer e protestar é um movimento similar que cresce em círculos conservadores. Ouça atenciosamente aos pregadores da Fé[iii]. A teologia, política e estilos culturais são diferentes, mas a heresia, blasfêmia e estranheza são as mesmas. O paganismo está crescendo em nossas igrejas. O gnosticismo especulativo ressurge em nossos círculos. Um horror de grande escuridão está brotando em nossa própria casa. Ainda assim, julgando pela maneira como a heresia é publicada e anunciada por respeitadas editoras evangélicas e assistida e lida por milhões de bons espectadores e leitores evangélicos, nós, evangélicos, amamos que seja assim. E isto é apenas o começo da degradação do pensamento evangélico que está chegando, a menos que experimentemos uma reforma.

Nosso trabalho, como seguidores de Cristo, não é fácil, mas é claro: o desafio, nas palavras de Paulo, é o de “não nos conformarmos com este presente século, mas sermos transformados pela renovação da nossa mente.” As correntes são velozes e as pressões são grandes, mas um foco no negativo está longe de ser algo negativo. É o primeiro passo para o mais positivo de todos, isto é, ter a mente de Cristo.

_______

Capítulo 16 – “Real, Reel, or Virtually Real?” – do livro “Fit Bodies, Fat Minds: Why Evangelicals Don’t Think and What to Do About it.” de Os Guinness, Hourglass Books, 1994,  traduzido por Renan Santos Lima.


[i] Originalmente, o autor faz um jogo de palavras com a pronúncia de “real” e “reel” (bobina), muito semelhantes entre si. O uso do termo será explicado a seguir.
[ii] Conhecidos como jogos RPG: “role-playing games”.
[iii] O autor refere-se ao movimento neopentecostal Palavra da Fé, proponente da Teologia da Prosperidade.

December 10, 2019

6 razões pelas quais não precisamos de líderes de louvor no culto - Jonathan Aigner




"De muitas maneiras, o líder de música é a pessoa mais importante na liderança da grande música congregacional."

Um amigo me enviou essa citação na semana passada, e a encontrei enterrada no material promocional de algo chamado "Word in Song", organizado por um grupo chamado Emu Music. Uma olhada na guia "Quem somos" revela que esse grupo é predominantemente anglicano. Tenha isso em mente. Não estamos falando de muitos discípulos de Hillsong ou evangélicos quase carismáticos aqui.

Naturalmente, como alguém que acredita de todo o coração que toda igreja cristã deve ser uma igreja que canta, essa citação e sua fonte me fizeram tremer. Há muito tempo é óbvio que, à medida que a sociedade moderna passou de fazer música a consumir música, a igreja livremente seguiu o exemplo. Mas cada vez mais a igreja litúrgica também está se rendendo aos padrões da música pop comercial. E um de seus princípios centrais é que você deve ter alguém cantando ao microfone. Você tem que ter um líder de música.

Aqui estão algumas razões pelas quais devo discordar.

1. Leva as pessoas ao consumo de música, e não à participação.

Durante minha última visita ao consultório do dentista, minha higienista me perguntou o que eu fazia. Depois que terminei de enxaguar e cuspir, disse a ela que era diretor musical da igreja. Como geralmente acontece quando as pessoas não entendem música sacra, ela me contou tudo sobre sua igreja, que naturalmente se encontra em um supermercado convertido. Aparentemente, seu pastor tocou uma vez na banda de Tommy Lee. Não, não Mötley Crüe, uma de suas outras bandas igualmente horrível, mas menos conhecida.
  
“Então, como esperado, nosso pastor realmente garante que nossa adoração seja incrível. É como um show de rock toda semana. "

"Sim, é quase o que eu esperava", eu disse.

A igreja que cultua não consome música, ela faz música. Mas o conceito moderno de vocalista veio da música pop comercial, escrita para um solista ou um pequeno grupo. Não é de admirar, então, que a maioria dos cultos pop ao vivo soa bastante semelhante à sala de shows. Um "líder" que canta com inflexão pop e tom afetado, enquanto inventa e improvisa ritmo e melodia, não pergunta a uma congregação: "Cante comigo". Ele diz: "Aborde o canto congregacional como se fosse um show".

2. Amplificação suprime o canto congregacional.

Um líder solo que canta com microfone envia uma mensagem à congregação de que seu papel é semelhante ao de uma platéia em um show de rock: "Cante se você quiser, mas isso realmente não importa". Como resultado, a natureza corporativa do culto reunido e a voz da congregação se torna completamente dispensável para tudo. Embora alguns possam estar cantando, às vezes até em voz alta, a função da congregação é mais passiva do que ativa.

3. O órgão é um líder melhor.

Muitas pessoas, especialmente os líderes de música, dirão que essa é simplesmente a minha opinião. Não creio. E embora muitos também apontem alguns exemplos históricos de órgãos que são proibidos em algumas igrejas, eles geralmente não reconhecem que o órgão de tubos realmente se desenvolveu dentro da igreja a serviço das necessidades litúrgicas da igreja.

O instrumento em si é inigualável em sua capacidade de permitir um bom canto congregacional. O órgão pode sustentar arremessos sem decaimento, conduzindo as frases, atraindo a música para fora da congregação. A articulação precisa no console pontua a frase para a congregação, respirando com eles e acompanhando a frase a seguir. Um órgão com boa voz e tamanho para a sala enfatizará as partes inferiores e superiores do tom, deixando espaço no meio para que as vozes humanas se encaixem. E, embora possa fornecer uma estrutura musical de apoio para encorajar os cantores, não pode cantar o texto para eles.

4. Cantores com microfones tendem a falar.

A pior teologia acontece na adoração quando saímos do script e, juntamente com o fato de que a maioria (mas certamente não todos) dos chamados "líderes de adoração" não são bem treinados teologicamente, mesmo as declarações planejadas tendem a ficar aquém da boa teologia ou significativa conexão com a liturgia. Mesmo se eles são treinados teologicamente, os tempos corporativos de oração cantada tradicionalmente usam linguagem refinada e elevada, temperada por séculos, impregnada nas Escrituras e na teologia. Não é hora de jogar um monte de balbúrdia extemporânea, que pode ser nada menos que desastrosa.

5. O líder de música frequentemente se torna uma vitrine para ego e personalidade.

Estamos vivendo os dias da celebridade cristã. Como eu disse antes, testemunhamos o advento da "estrela de adoração", especialmente nas últimas duas décadas. Conceder um microfone a um músico está oferecendo a eles muita força e prestígio. Alguns transformam o culto corporativo em uma rotina de comédia com humor e carisma. Alguns aproveitam a oportunidade para mostrar seus próprios estilos pop afetados e construir sua celebridade no molde de tantos outros. Alguns exploraram a vulnerabilidade de uma congregação emocionalmente comprometida. Basta olhar para as vendas de discos da chamada "indústria de adoração". Mesmo aqueles que se esquivam do título de "superstar", bem, eles podem realmente negar que é isso que eles são?

A chamada "indústria do culto" exacerbou esse fenômeno. Como nossa cultura está muito acostumada a ouvir música para entretenimento, criamos nossas próprias celebridades. Não se engane sobre isso. A igreja também faz isso. Começamos a associar o culto a uma pessoa e a uma apresentação, em vez da oração corporativa por meio da Palavra e do Sacramento.

6. A música tradicional da igreja praticamente canta a si mesma.

Temos uma rica história de salmos, hinos, canções e canções, criadas com belas melodias eminentemente cantáveis, com uma rica estrutura harmônica, um grupo ao qual cada geração acrescentou o melhor. Então decidimos que não precisávamos mais dessas coisas. Então substituímos nossos hinos por novas músicas, escritas para gravações comerciais solo.

E foi aí que decidimos que precisávamos de um líder de música, com uma banda cover de alto nível.

Mas nós não. Nós nunca fizemos. Nós apenas precisamos cantar.

Vamos continuar

Estou pronto para superar líderes de música no culto. Estou pronto para sair do ataque musical amplificado. A igreja deveria estar também, e é hora de se auto-corrigir.

Precisamos ensinar nossas congregações a cantar, e não apenas ter alguém com microfone cantando.



Reformando o Culto: Reverência, a Tradição Reformada e a Crise do Culto Protestante - D. G. Hart



Dentro dos círculos evangélicos, tanto clero quanto laicato estão dando grande atenção ao culto. As congregações cantam “cânticos de louvor” (completos com projetores e guitarras) ou corais treinados (completos com becas e órgão de tubos) deveriam cantar as grandes obras da música sacra? Os cultos deveriam ser atualizados para serem mais amigáveis, mais acessíveis aos “sem igreja” ou deveriam continuar com seus padrões tradicionais, mesmo que causassem estranheza a visitantes? O pastor deveria ser o único líder do culto ou o laicato também poderia conduzir o culto, seja orando ou cantando? Numa cultura que acha muito falatório entediante, o sermão de 35 minutos deveria continuar a ser um elemento central do culto ou as congregações deveriam se abrir para formas menos verbais de expressão, como dança litúrgica e teatro? Essas são as perguntas que atormentam não apenas evangélicos, mas também congregações presbiterianas e reformadas na América do Norte e, cada vez mais, no resto mundo.
Frustrados pelo que compreendem como superficialidade e vazio de muito do culto contemporâneo, alguns conservadores abandonaram comunhões evangélicas e reformadas rumo à Igreja Episcopal, mas também à Igreja Ortodoxa Oriental e a Igreja Católica Romana. Essas pessoas estão cheias desse culto que, segundo um crítico, é “uma coisa personalista, subjetiva e improvisada”. Ninguém consegue concordar com o que é o culto. “É bater num tamborim, participar em evangelismo, oração, cantoria, falar em línguas – é o quê?”
O que é curioso sobre o descontentamento contemporâneo com o culto é que a trajetória tomada por aqueles que estão partindo rumo a Cantuária, Roma e Constantinopla nunca passa por Genebra. No entanto, o culto reformado jamais foi hospitaleiro ao subjetivismo, individualismo e banalidade das quais esses peregrinos estão fugindo. Evelyn Underhill, em seu livro, Adoração (1936), descreveu o culto de João Calvino como um “puritanismo austero” que “em última instância, concentrava-se no Deus Eterno em sua majestade não vista” e que “tem um esplendor e valor espiritual que lhe é próprio”. O culto reformado, continuou Underhill, era “um poderoso corretivo contra a piedade humanística, comunicando a verdade permanente da realidade única de Deus e de seu total zelo, além da pobreza, dependência e obrigação do homem”. Isso parece que seria um bem-vindo corretivo ao espírito antropocêntrico e terapêutico que caracteriza tantos cultos de hoje.
Então, por que os críticos do culto evangelical não estão tirando o pó de suas cópias das Ordenanças Eclesiásticas, de Calvino, e do Saltério Genebrino? A descrição do culto de Calvino feita por Underhill fornece pistas para uma resposta.
Não eram permitidos em suas igrejas nenhum órgão, nem coral; nenhuma cor, nem ornamento, senão uma mesa e os Dez Mandamentos na parede. Nenhum ato, nem gestos cerimoniais eram permitidos. Nenhum hino era cantado, senão aqueles derivados de alguma fonte bíblica.
As pessoas que buscam uma liturgia elaborada, experiência elevada e muito drama não são muito atraídas pelo culto reformado. Os críticos argumentam que a tradição reformada despiu o culto, negando elementos humanos do culto, o que deixou os presbiterianos sem liturgia ou ritual, portanto, sem espaço para a presença sacramental no culto.
No entanto, essa crítica ao culto reformado – que provavelmente encontraria apoio entre muitos calvinistas – não entende o que é liturgia e sacramento. Afinal de contas, toda igreja tem uma liturgia, independentemente de os membros se conceberem litúrgicos ou não. A liturgia é apenas a forma e ordem do culto. Tanto a mais alta missa anglo-católica quanto o mais baixo culto “de louvor e adoração” evangelical são litúrgicos no sentido mais estrito da palavra. Obviamente, eles diferem dramaticamente em liturgia, mas ambos incorporam uma forma e ordem de culto. Até mesmo Underhill, que criticava Calvino, reconheceu o caráter litúrgico da adoração reformada: “o interior sombrio de uma verdadeira igreja calvinista é, em si mesmo, sacramental: um testemunho da inadequação humana diante do Divino”.
De uma perspectiva diferente, então, o culto reformado pode ser do tipo mais elevado ou do tipo mais comum de culto, pois Calvino esmerou-se por fazer todo aspecto do culto – do desenho do interior da igreja ao modo de cantar – conformar-se ao caráter e à graça do Deus que se revelou em Cristo e nas Escrituras. De fato, a teologia de Calvino e sua compreensão acerca do culto parecem se encaixar e se reforçar tão bem que é de se admirar que as pessoas de tradição reformada possam querer tentar manter a teologia calvinista consistentemente sem entusiasticamente abraçar os elementos e o caráter do culto reformado como formulados e praticados nos séculos XVI e XVII.
Calvino e o Culto
    Invocação
Princípios do Culto Reformado
O Impulso Revisionista
Uma Questão de Reverência

Um axioma da teologia de João Calvino era a importância e centralidade do culto de adoração para uma genuína fé e prática cristã. De fato, Calvino punha o culto antes da salvação em sua lista das duas mais importantes facetas da religião bíblica. Ele escreveu que a religião cristã preserva sua verdade por meio de “um conhecimento, primeiramente, do modo como Deus é devidamente cultuado; e, segundamente, da fonte de onde a salvação é obtida”.[1]
Calvino também observou que a primeira tábua da lei – os quatro primeiros mandamentos – todos se relacionavam diretamente com o culto, tornando-o, assim, “o primeiro fundamento da justiça”. 
A proeminência do culto levou Calvino a articular o seu princípio regulador, um dos marcos da tradição reformada. O princípio regulador ensina que o culto público é governado pela revelação de Deus em sua Santa Palavra: quaisquer elementos que componham o culto público devem ser diretamente ordenados por Deus na Escritura. O fato de uma congregação sempre ter cultuado de um modo particular ou de uma determinada prática advir de piedade sincera são justificativas insuficientes para esse culto. Segundo Calvino, Deus não apenas “considera infrutíferos, mas também totalmente abomina” o que quer que não se conforme à sua vontade revelada. “As palavras de Deus são claras e distintas”, escreveu Calvino, “’Obedecer é melhor do que o sacrificar’. ‘E em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos dos homens.’ (1 Sm 15:22, Mt 15:9)”.[2]
O desejo de obedecer a Deus não apenas moldou a concepção de Calvino do princípio regular, mas igualmente importante era sua compreensão da depravação humana. O efeito principal da primeira transgressão de Adão foi transformar todas as pessoas em idólatras. Calvino cria que todos os indivíduos possuíam uma semente de religião ou um sentido de Deus em suas almas, mas, após a queda, esse sentido religioso não levava mais ao verdadeiro Deus, antes, forçava homens e mulheres a criarem deuses à sua imagem, deuses que se conformavam a seu egoísmo e vaidade. A tentação da idolatria exigia que os cristãos estivessem sempre vigilantes em regrar seu culto pelas ordens diretas de Deus na Escritura. Essa tentação deixava Calvino especialmente suspeitoso de práticas no culto que eram tidas como agradáveis ou atraentes aos membros da congregação. Sobre as práticas, ele disse que “tanto mais suspeitas são para os fiéis quanto mais deleitam o intelecto humano”.[3]
A teologia do culto de Calvino exigiu reformas das práticas católicas romanas que ele encontrou em Genebra, mas a necessidade de reforma nem significou o abandono da liturgia, muito menos exigiu a eliminação de todos os elementos da liturgia católica. Os reformadores purificaram as práticas de seus dias, transformaram o conteúdo teológico e espiritual do culto cristão, mas eles não criaram uma nova ordem de culto do nada. Ao invés disso, eles alteraram os elementos de culto para se conformarem à teologia da Reforma. A liturgia em Calvino, por exemplo, demonstra continuidade com o passado ao mesmo tempo em que reflete mudanças derivadas de novas percepções na revelação de Deus. A ordem de culto era basicamente a seguinte:
    Confissão de Pecados
    Oração por Perdão
    Cântico de um Salmo
    Oração por Iluminação
    Lições da Escritura
    Sermão
    Coleta das Ofertas
    Orações de Intercessão
    Credo Apostólico (cantado enquanto os elementos da Ceia do Senhor são preparados)
    Palavras da Instituição
    Instrução e Exortação
    Comunhão (enquanto um salmo era cantado ou uma escritura era lida)
    Oração de Ação de Graças
    Bênção
Embora Calvino tenha seguido um padrão regular em seus cultos, ele não acreditava ser possível prescrever todas as questões concernentes à adoração. Ele reconhecia que havia questões incidentais não determinadas pela Escritura. Nesses casos, as igrejas tinham a Liberdade, sob as diretrizes gerais da Bíblia, de implementar práticas que honrariam a Deus e edificariam seu povo. Apesar de o princípio regulador ensinar que uma prática específica devesse ser comandada pela Palavra de Deus, ele também garante liberdade em áreas onde a Escritura não é explícita.
Embora Calvino e outros reformadores tenham hesitado em prescrever uma liturgia específica para todas as igrejas, em toda a Europa Ocidental, houve notável concordância entre as igrejas presbiterianas e reformadas sobre a natureza do culto do século XVI até boa parte do século XVIII. De fato, as instruções para o culto trabalhadas pelas igrejas reformadas, de Calvino à Assembleia de Westminster, sugerem cinco princípios que deveriam governar o culto na tradição reformada.
O primeiro é a centralidade da Palavra de Deus. A Palavra de Deus não apenas direciona a forma ou modo do culto, mas também abrange o conteúdo do culto. Ela é lida, cantada, vista (na Ceia do Senhor) e pregada. A centralidade da Palavra de Deus está especialmente evidente na ênfase reformada na pregação. Em contraste ao culto Católico Romano, onde o foco é a missa e o altar é a peça central da arquitetura eclesiástica, os reformadores tornaram a pregação a parte central do culto e puseram o púlpito no centro do santuário.
Um segundo princípio da teologia reformada, que é bastante relacionado ao primeiro, é que o culto é teocêntrico. O culto é centrado em Deus e seu objetivo deve ser a glória de Deus. Ele é a mais alta forma de comunhão entre Deus e seu povo, devendo ser feito em espírito e verdade. Não há nada que Deus odeie mais do que o falso culto. O culto é absolutamente necessário à fé e prática cristãs porque Deus o ordena e Ele nos constituiu de tal modo que o culto é essencial para o fortalecimento de nossa vida espiritual.
Isso significa que o culto não é feito para evangelismo. O fato de os cultos no Dia do Senhor terem se tornado “sensíveis aos que buscam” mostram uma perversão da natureza do culto. O culto público é para o povo de Deus, pois apenas o seu povo é que pode adorá-lo em espírito e em verdade. Os descrentes devem ser bem-vindos e encorajados a ouvir a pregação da palavra, o que o Breve Catecismo de Westminster descreve como sendo meios “especialmente” eficazes de “convencer e converter pecadores”.[4] Não obstante, o modo pelo qual Deus traz pessoas a si não deveria nos fazer confundir a natureza do culto. Se nós incorporarmos evangelismo ao culto, isso é apenas um sinal de preguiça, não uma indicação de que peritos em crescimento de igrejas estão certos. Cultos evangelísticos têm seu lugar e a Igreja precisa levar a sério a Grande Comissão, mas o discipulado também é parte das instruções de Cristo a seus discípulos e o culto é um dos principais meios pelos quais “as bênçãos da redenção de Cristo”[5] nos são aplicadas.
O caráter dialógico do encontro de Deus com seu povo é o terceiro princípio que governa o culto reformado. O culto público ou corporativo é o encontro de Deus com seu povo. Os crentes vêm por convite dele e são recebidos à presença dele. Deus fala por meio da invocação, da leitura da Palavra, do sermão e da bênção. Os adoradores respondem em canto, oração e confissão de fé.
Esse caráter dialógico do culto levanta a questão bastante debatida de sentimentos ou emoções no culto. Para muitos que estão fora e para muitos [autoproclamados] porta-vozes de jovens nas igrejas reformadas (adolescentes frequentemente demonstram compreensão de culto melhor que seus pais), o culto parece tedioso e repressivo. Muitos querem que a igreja seja mais aberta, expressiva e emotiva. Ainda assim, o que muitos desses críticos parecem não entender é que que Deus nos disse em sua palavra como nós devemos reagir a Ele. No culto, nós reagimos a Deus através de canto, oração e confissão de fé. Para alguns, no entanto, esse não parece ser o veículo mais apropriado para reagir. Eles prefeririam reagir a Deus do mesmo modo como reagiriam ou participariam em um show de rock, um jogo no estádio[6] ou uma apresentação de uma orquestra.
Reparar na afinidade entre o entretenimento moderno e o culto contemporâneo é apontar com precisão uma das fontes de equívoco em muito do pensamento atual sobre culto, pois há uma vasta diferença entre reagir a entretenimento e entre ouvir e submeter-se à palavra de Deus. No entanto, isso passa despercebido em muitos membros de comitês de culto em muitas congregações presbiterianas e reformadas.
Muitos indivíduos chegam ao culto esperando expressar emoções e afeições pessoais como parte de sua reação a Deus. O que eles erram em reconhecer é que o culto na igreja é corporativo, portanto, deveria ser apropriado ao que pessoas podem fazer como um corpo ou grupo. O Diretório de Culto de Westminster, que foi escritos pelos teólogos de Westminster, é justamente isso: um guia para o culto público ou corporativo. Em nossas casas de culto, nós adoramos como povo, não como indivíduos.
Uma analogia que ajuda a explicar isso é a relação entre um pai e seus filhos. Um filho pode se expressar de um modo para seu pai quando estão sozinhos juntos. Há uma chance de ser mais íntimo e expressivo. Contudo, quando o mesmo filho está na presença do pai juntamente com seus dois irmãos e duas irmãs, ele normalmente não vai demonstrar o mesmo nível de intimidade ou afeição de quando ele e o pai estão sós. Seria rude, por exemplo, que esse filho esperasse sentar no colo do pai se essa demonstração de afeição sugerisse favoritismo ou se tornasse uma barreira à comunicação e comunhão dos outros filhos com o pai. No entanto, é virtualmente isso que acontece quando alguns membros da congregação querem que seus sentimentos pessoais sejam incorporados ao culto.
O quarto princípio do culto reformado é simplicidade. A plena revelação de Deus em Cristo na Nova Aliança significa que os cristãos não são mais dependentes dos elementos infantis e carnais da Antiga Aliança. Por causa da obra de Cristo, os crentes já podem se sentar com Ele, em glória, quando se reúnem para cultuar. Esse aspecto da obra de Cristo grandemente reduz a necessidade para apoios visíveis ou materiais no culto. Simplicidade no culto, portanto, está intimamente relacionada a espiritualidade. Na Nova Aliança, segundo a teologia reformada, Deus está mais plenamente presente com seu povo do que na Antiga Aliança, mas essa presença é espiritual, não física. A ordem de Cristo para que seus seguidores o adorem em espírito e verdade é consoante com o novo arranjo entre Deus e seu povo.
A simplicidade também sugere rotina. Os cultos evangélicos contemporâneos têm sido tão repaginados e ensaiados num esforço para manipular a congregação a uma experiência de culto que parece que os diferentes elementos de culto foram desenhados para despertar sentimentos ou emoções que seriam, de algum modo, mais íntimas e mais expressivas da comunhão com Deus. Em outras palavras, muitos cultos públicos contemporâneos chamam atenção para o culto em si e para seus dirigentes. Muitos desses cultos são concebidos por pessoas que se consideram devotas e acreditam que, se a congregação apenas seguir seu exemplo, ela também terá uma íntima experiência com Deus (eles são até chamados de “líderes de louvor”).
Em contraste, o culto reformado mantém que o culto não deveria ser original ou criativo. Ao invés disso, ele deveria ser rotineiro, ordinário e habitual. C.S. Lewis não era nenhum teólogo reformado, mas ainda assim enunciou um ponto que é apoiado pela tradição reformada quando disse que um culto público “funciona melhor quando, através de longa familiaridade, nós não temos que pensar sobre ele”. “O perfeito culto na igreja”, ele acrescentou, “seria aquele a que nós mal notássemos, aquele onde toda a nossa atenção estivesse em Deus.”[7]
Tudo isso é impedido pela novidade. A novidade fixa nossa atenção no próprio culto; e pensar acerca do culto é diferente de cultuar. […] “É louca a idolatria que engradece mais o culto do que o deus”. Mas ainda pode acontecer algo pior. A novidade pode fazer com que nossa atenção não se centre no culto, mas no celebrante. […] Verdadeiramente, pode-se desculparo homem que disse: “Eu gostaria que eles se lembrassem de que a tarefa encomendada a Pedro foi ‘apascenta minhas ovelhas’, não ‘faze experimentos em meus ratos’, nem ‘ensina novos truques a meus cães adestrados’”.[8]
O quinto e último – e, talvez, o mais importante – princípio do culto reformado é a reverência. Segundo Calvino, a “religião pura e real” se manifestava através da “fé aliada a sério temor de Deus, de modo que o temor em si contém reverência espontânea”. O culto deveria ser digno e reverente, mas ele não atinge essas qualidades mediante cerimônias muito elaboradas ou liturgias complexas. De fato, Calvino acreditava que onde “grande é a ostentação em cerimônias, rara, porém, é a sinceridade de coração”.[9]
Diferentemente do que alguns críticos do culto reformado têm acusado, isso não significa que o culto não tenha lugar para alegria ou emoção. A alegria deve ser uma parte do culto, juntamente com uma gama completa de emoções – i.e., tristeza, raiva, desejo, esperança e medo – mas a necessidade de reverência e decoro dita que qualquer expressão de emoção durante o culto deveria ser temperada por moderação e autocontrole. Para garantir que todo aspecto do culto seja feito decentemente e em boa ordem, a tradição reformada insiste que todo culto seja supervisionado pelos presbíteros, que têm responsabilidade pelo culto público, e que o ministro, que fala por Deus e pelo povo de Deus, lidere e dirija o culto.
Um modo útil de entender a reverência pode ser o de pensar no ethos de um culto fúnebre para um cristão professo (apesar de os teólogos de Westminster não aprovarem cultos fúnebres). Ali, nós contemplamos a morte de um amado, estamos cheios de tristeza e somos lembrados de nossas próprias fraquezas. Ainda assim, quando o falecido é um crente, o culto também é uma ocasião para alegria porque cremos que Deus chamou um de seus filhos para estar com Ele que aquele crente foi “aperfeiçoado em santidade” e entrou “imediatamente na glória”.[10]
Por que um culto público deveria ser diferente? Em nossos cultos, a morte de Nosso Senhor é central. Claro, nós não paramos na morte de Cristo. Depois disso, nós nos regozijamos em sua ressurreição, sem a qual, diz o apóstolo, nós não teríamos esperança[11].  Ainda assim, a alegria que experimentamos em contemplar e adorar o nosso Salvador ressurreto é uma emoção que vem sempre tingida de gravidade e humildade. Não é a alegria de uma festa celebrando o campeonato nacional de um time esportivo; é uma alegria que não apenas reconhece o sofrimento e morte de Jesus Cristo, mas também reconhece nossa própria cumplicidade, devido ao nosso pecado, em dor e morte cheias de ignomínia.
Os padrões e as ideias sobre culto permaneceram relativamente constantes na prática reformada e presbiteriana, mas, nos últimos 20 anos, a teologia e prática do culto reformado têm sido levado aos limites.[12] Várias denominações tentaram revisar seus diretórios de culto, enquanto incontáveis congregações estabeleceram comissões de liturgia cuja única função para ser modernizar o culto. Embora em alguns casos as mudanças propostas tenham sido guiadas por considerações reformadas e biblicamente sãs, eles também expõem um descontentamento genuíno com o culto dentro do arraial reformado. Esse descontentamento provavelmente foi mais bem resumido num relatório recente de uma denominação presbiteriana conservadora:
Há uma insatisfação geral ou, pelo menos, uma generalizada falta de uso na igreja do atual Diretório. Há partes do atual Diretório que estão tão datadas (e.g., “o imponente ritmo do coral”) que tem de haver uma revisão completa. No entanto, não há consenso de aonde a igreja quer ir em matéria de culto. A situação atual na igreja em relação do culto é diversa, variando de uma quase anarquia litúrgica a outros que sentem que cantar hinos não inspirados constituem uma violação do princípio regulador.
Como se chegou ao atual estado? Alguns talvez apontem a novas perspectivas bíblicas que os velhos hábitos de culto e sua teologia subjacente estavam muito mais ligados a uma forma de expressão cultural específica do que ao ensinamento da Palavra de Deus. Outros citam o crescimento limitado das igrejas que não mudam seu culto e a falta de capacidade do culto tradicional de atrair a juventude cristã como fatos que exijam que o culto seja tornado relevante e livre dos padrões mais antigos – e, supostamente, humanos – de culto. Outros enxergam esse descontentamento em matéria de culto como claras indicações de um abandono da teologia de culto reformada.
Muitas das mudanças de pensamento sobre o culto nos últimos 25 anos se originam em transformações significantes da cultura americana. Os velhos modos de cultuar não parecem mais plausíveis; parecem inefetivos, se não estranhos. O ministério efetivo da Igreja, alguns diriam, exige que ela se mantenha em dia em contextualizar o evangelho a fim de torná-lo compreensível para a cultura contemporânea. Se isso significar abandonar o modo de culto que data dos anos 1930, que seja assim. Contanto que o conteúdo do culto seja são, a forma realmente não importa. Assim, as mudanças no culto são apenas alterações de forma: abandona-se o estilo dos anos 1930 em favor da cultura dos anos 1990.
É irônico que crentes consigam ser tão acríticos das expressões culturais contemporâneas, levando-os a pensar que o estilo dos anos 1990 seja adequado ao culto, quando os mesmos crentes ficam tão alarmados com os males dessa mesma cultura. Também é notável quantos calvinistas, que insistem que tudo seja feito para a glória de Deus tão frequentemente julguem um culto conforme ele seja agradável a homens, mulheres e, especialmente, adolescentes.
A maioria dos cristãos concordaria que o povo de Deus está em tempos difíceis. A Igreja enfrenta políticas injustas da parte do governo, o relativismo moral do sistema de ensino e a decadência da mídia. Ainda assim, poucos parecem reconhecer os perigos mais sutis da cultura americana. Uma das mais insidiosas e sutis influências na igreja vem da mídia e da indústria do entretenimento. Os ministros frequentemente pregam sobre os perigos escancarados de Hollywood, alertando contra sexo, violência e desrespeito pela religião em muitos filmes, programas de TV e músicas populares. Uma influência muito mais perigosa, contudo, é o modo como a cultura popular alterou as atitudes em relação ao culto.
A cultura popular tem promovido uma mudança significativa nas percepções sobre o culto público. Cada vez mais, os cristãos exibem vontade de considerar seu tempo juntos coletivamente do mesmo modo como pensam em formas públicas de entretenimento. O culto vira uma apresentação para uma congregação. Não há mais a convicção de que a audiência do culto não é a congregação, mas o próprio Deus.
Ainda mais alarmante é o modo como a cultura popular gestou um ethos de informalidade, de quebra de distinções entre o que é solene e o que é desrespeitoso. O culto mais antigo parece defasado – a frase “o imponente ritmo do coral” não faz sentido – porque nossa cultura despreza ou não tem uso para aquilo que é digno e majestoso. O que torna expressões contemporâneas ou populares de culto questionáveis a partir de uma perspectiva reformada não é que elas não sejam de alta cultura – embora as orações, adoração e música dos cultos de hoje sejam frequentemente triviais. Crentes podem adorar a Deus gostando ou não de uma sonata de Mozart ou de uma escultura de Michelangelo. Ao invés disso, o problema de muito do culto contemporâneo é que ele não reconhece a percepção do calvinismo, a saber, que as pessoas (cristãos, inclusive) são constantemente tentadas a moldar Deus às suas próprias imagens. O culto reflete a concepção de Deus que um povo tem. Muitas das inovações no culto moderno comunicam uma imagem errada de Deus. O culto é uma declaração de convicção teológica sobre quem Deus é e sobre quem nós somos enquanto seu povo, o povo da aliança.
A teologia reformada sempre manteve que, quando crentes se reúnem no Dia do Senhor, suas práticas devem refletir humildade e reverência. Os cristãos vêm perante o Santo e Transcendente, que é o justo Juiz do universo, a quem homens e mulheres ofendem diariamente e que maravilhosamente providenciou um caminho de salvação mediante seu Filho, Jesus Cristo. O culto deveria ser um lembrete do golfo entre Deus e pecadores, do que Deus fez para superar esse golfo para que os crentes não caíssem num falso entendimento de Deus. No culto, os cristãos professam e honram o caráter do Deus em cuja presença eles entram e que os tirou de um estado de pecado e miséria. O culto, portanto, não é algo a ser feito de modo leve ou sem séria consideração.
As formas e estilo da cultura contemporânea não conseguem ter a dignidade e respeito que deveriam caracterizar a postura interna e externa de cristãos quando eles se aproximam do trono de Deus. Embora haja um apelo terapêutico em pensar no culto como se se entrasse num bar aonde Deus serve como o garçom amigo, sempre pronto a ouvir o que temos a dizer e a limpar nossas lágrimas e nossas mesas, o Deus revelado na Escritura é um rei que se senta altivo em seu trono de glória, atento a palavras, pensamentos e emoções de seus súditos no que eles se reúnem perante a si.
Fique-se claro que esse rei também é nosso Pai. Contudo, à luz do que o 5º mandamento e o Apóstolo Paulo dizem acerca do respeito e temor que as crianças devem ter por seus pais, a imagem de Deus como nosso pai não permite indiferença ou frivolidade no culto. O culto recomendado e praticado por Calvino, Knox e pelos teólogos de Westminster refletem uma combinação reverente de alegria e temor. A maneira mais antiga de culto sempre foi restringida pelo senso de que qualquer exibição de irreverência ou desrespeito ofenderia Deus.
Ao invés de seguir os impulsos liberacionistas e irreverentes da cultura Americana, os calvinistas precisam, se quiserem ter algo a dizer nas discussões contemporâneas sobre culto, recuperar em sua teologia e prática de culto aquilo que o Salmo 2:11 fala quando diz que o povo de Deus deveria “alegrar-se com tremor”. Não há versículos melhores para caracterizar o culto reformado do que Hebreus 12:28-29. “Por isso, recebendo nós um reino inabalável, retenhamos a graça, pela qual sirvamos a Deus de modo agradável, com reverência e santo temor; porque o nosso Deus é fogo consumidor.”
Essa concepção tem caracterizado o culto presbiteriano e reformado desde a Reforma. É de se perguntar como que as igrejas reformadas conseguem reter sua herança teológica de modo significativo ao passo que abandonam a essência do culto reformado, tendo especialmente em vista que o culto semanal fornece o fundamento e reforço para a própria teologia que os crentes reformados confessam. O abandono do culto reformado pode pelo menos explicar por que aqueles que buscam um culto com dignidade e reverência partem frequentemente para comunhões não reformadas. Se as igrejas reformadas forem ser fiéis à sua teologia e forem oferecer às almas cansadas algum descanso da superficialidade e banalidade do culto evangélico contemporâneo, elas precisam recuperar a liturgia e a teologia de culto da tradição reformada: um culto que que leva a sério a noção de que Deus é, de fato, “um fogo consumidor”.
[1] CALVINO, João. A Necessidade de Reformar a Igreja. In: ORGANIZADOR. As Obras de João Calvino. Recife: Editora CLIRE, 2018. Vol. 1, p. 155.
[2] Idem
[3] Institutas IV.X.XI
[4] Breve Catecismo de Westminster, Pergunta 89.
[5] Idem, Pergunta 88
[6] No original, “um jogo de beisebol”.
[7] LEWIS, C.S. Oração: Cartas a Malcolm.
[8] Idem
[9] Institutas I.II.II
[10] Breve Catecismo de Westminster, Pergunta 37
[11] 1 Coríntios 15:19
[12] Mantenha em mente que o Dr. Hart escreveu este artigo em 1995.

Tradutor: Natan Cerqueira

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