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April 8, 2020

Em Tempos de Pandemia, Como Fica a Comunhão? Rev. Heber Junior


A pandemia gerada pela COVID-19 tem mexido com os nossos relacionamentos porque, em um mundo quebrado como o nosso, relacionamentos sempre sofreram com os efeitos da Queda. O Coronavírus é apenas um lembrete de que o pecado trouxe barreiras sociais resultando em desajustes em nossas sociabilizações (inveja, ira, irresponsabilidades), idolatrias de relacionamentos (namoro, trabalho, família) e falta de satisfação nessas relações (descontentamento). Pecado é muito maior do que Coronavírus e ele tem nos afetado socialmente desde a Queda.
Por isso, a nossa redenção tem um elemento social. Cristo quebrou as barreiras sociais objetivamente (Ef 2.14-16), tornou possível que fôssemos feitos um só povo, uma só nação, um só corpo sob o mesmo Cabeça. Ainda que a presença física de Cristo esteja temporariamente suspensa, estamos unidos a Ele pelo Espírito, e é tal Espírito que promove a nossa comunhão com Deus (2 Co 13.13) e com o próximo (Fp 2.1). Por isso a igreja, desde a patrística, tem sido chamada de “comunhão dos santos” (Credo Apostólico) e durante a Reforma celebrou esse termo para a igreja (João Calvino). Mas como fica a nossa comunhão em tempos de quarentena, de isolamento social?
Essa pergunta não é só teórica ou retórica, mas eminentemente prática e requer ponderação. Teólogos do passado articularam a necessidade de contato físico e presencial para o exercício da comunhão. A Confissão de Fé de Westminster diz que os crentes unidos a Cristo “estão obrigados ao cumprimento dos deveres públicos e particulares que contribuem para o seu mútuo proveito, tanto no homem interior como no exterior.” (CFW 26.1). O parágrafo seguinte diz que os cristãos estão “obrigados a manter uma santa sociedade e comunhão no culto de Deus e na observância de outros serviços espirituais que tendam à sua mútua edificação, bem como a socorrer uns aos outros em coisas materiais, segundo as suas respectivas necessidades e meios” (CFW 26.2). A Confissão de Fé está nos ensinando acerca de edificação mútua no ajuntamento público (Hb 10.24-25), mas também nos lembrando que comunhão estende além da localidade de culto, abrangendo a comunhão de bens com os necessitados (At 2.42, 44-45). Estamos parcialmente impedidos de prestar serviços espirituais e de socorrer as pessoas materialmente. Portanto, estamos experimentando obstáculos à experiência de comunhão.
Não podemos dizer que os meios virtuais suprem totalmente essa falta. Por sermos seres físicos, há coisas que não podemos fazer à distância. Não podemos experimentar todas as coisas do culto quando estamos sozinhos: não expressamos nossa alegria em louvores a uma só voz, não batizamos virtualmente e não partilhamos do pão da ceia. Sobre esse último assunto, Scott Swain disse muito acertadamente que não podemos partilhar da ceia virtualmente porque o sinal do sacramento não reside somente nos “elementos” (pão e vinho) mas inclusive na refeição compartilhada (1 Co 10.17; 11.33), exatamente o que não acontece quando estamos separados; por isso, ele argumenta que estamos em tempo de lamento, no qual não participamos da ceia, embora ansiamos o dia de tê-la de volta. [1]
Pelas mesmas razões semelhantes às da ceia, também não podemos ser reunidos em culto público. Isto é, podemos prestar vários cultos separadamente (individual ou doméstico), mas não cultuamos virtualmente, exatamente porque culto público é sinônimo de ajuntamento. Isto é, testemunhamos como corpo reunido que somos adoradores do Cristo ressurreto. Pregamos essa realidade contra os desigrejados, defensores da irrelevância de participar de uma igreja local. Além de culto, também somos impedidos de prestar certos serviços materiais aos irmãos. Portanto, é inegável que estejamos experimentando uma privação na experiência dessa comunhão. Não podemos fugir dessa realidade de que não saboreamos a doçura da comunhão dos santos da mesma forma como fazíamos antes da pandemia.
Meu lamento, contudo, não visa expressar uma visão pueril e pessimista de comunhão. Quando chamamos aquele momento após o culto de “café da comunhão”, aí sim estamos dizendo que comunhão é tão banal quanto tomarmos café juntos. Costumamos igualar comunhão a encontros, a reuniões, e assim perdemos o peso do que significa termos comunhão com Deus e com os irmãos, algo que extrapola o encontro físico. No íntimo, sabemos que a comunhão com Deus e com o próximo não acabou porque o Coronavírus nos deixou em casa longe uns dos outros; existe algo muito rico que, mesmo não sendo experimentado plenamente, é real em nossas vidas. Portanto, precisamos encontrar uma forma mais profunda de expressar essa verdade bíblica.
É aqui que podemos aprender com o início da Primeira Epístola de João. O apóstolo João tivera um contato físico com Jesus e estava testificando da realidade de seu ministério àqueles que não haviam visto ou apalpado a Jesus (cf. Jo 20.30-31). Na sua primeira epístola João queria ensiná-los que, mesmo sem o contato físico com Jesus, os leitores também tinham comunhão com o Pai e com o Filho (1 Jo 1.1-3), além de comunhão com os irmãos (1 Jo 1.7). João está preocupado em certificar crentes de sua fé (1 Jo 5.13); ele quer mostrar aos seus leitores como podemos saber que temos comunhão com Deus e com os santos. Já que o contexto de falso ensino estava assolando a fé cristã, João promove os chamados “testes” para que os fiéis fossem confirmados na fé: o teste doutrinário (1 Jo 2.22-23; 4.2-3), o teste social (1 Jo 2.7-11; 3.11-18) e o teste moral (1.5-10; 2.3-6). É significativo que esses testes expressem que nossa comunhão com Deus está calcada na verdade (aspecto doutrinário), no usufruto de atributos divinos (aspecto moral) e na realidade de estarmos unidos a Cristo (aspecto social). Sendo assim, 1 João é uma carta para nos ajudar a compreender a riqueza da nossa comunhão com Deus e com os santos.
Há muito que o Novo Testamento nos ensina sobre “comunhão” ( koinonia em grego) que não podemos compartilhar nesta postagem. Em geral, o conceito de comunhão está ligado a ter algo em comum com alguém. Como o koinonos é o ‘companheiro’ (Lc 5.10; 2 Co 8.23; Fl 17), exercer ‘comunhão’ está relacionado a partilhar bens (At 2.42, 44; Rm 15.26; 2 Co 8.4; 9.13), cooperar em serviço (Fp 1.5; Hb 13.16), e participar no mesmo ofício (Gl 2.9). No entanto, Peter Toon afirma que 1 João traz o uso teológico mais claro de toda a Escritura, no qual o sentido básico de ‘comunhão’ é de um partilhar real e prático da vida eterna com o Pai e com o Filho.[2] Somos inseridos na vida de Deus e isso nos permite compartilhar de suas bençãos. É Deus quem produz essa comunhão com Cristo pelo Espírito, assim como a unidade da igreja é produzida pelo Espírito (Ef 4.3). Isto é, esforçamo-nos por preservar essa unidade intacta, livre de empecilhos pecaminosos, assim como esforçamo-nos por manter a comunhão sem barreiras. Isso nós devemos fazer! Mas não conseguimos criar ou aniquilar a comunhão com Deus e com a igreja.
Perceba que essa comunhão com Deus não pode ser rompida nem mesmo pelo nosso pecado (1 Jo 1.7-2.2). O pecado pode tirar nossa alegria da salvação (Sl 51.12), mas não nos tira a salvação. Pecados maculam a doce experiência de deleite na presença de Deus, mas graças a Deus eles não podem nos desconectar do Senhor. Nos Salmos, o salmista tinha a experiência de que o Senhor lhe havia abandonado; mas era apenas a sua experiência que estava prejudicada, seu saborear das graças divinas, não seu status com Deus. O sangue de Jesus é a base enquanto a confissão de pecados é o meio para restaurar essa experiência de deleite com Deus e com o próximo (1 Jo 1.7, 9).
A lógica de João procede dizendo que se nossa conduta está pautada pela luz, então não só temos comunhão com Deus (1 Jo 1.6), mas temos comunhão com os irmãos também (1 Jo 1.7). Essa comunhão é muito mais significativa do que mera sociabilização. Assim como comunhão com Deus expressa uma intimidade singular, a ponto de sermos chamados corpo de Cristo, essa ligação íntima se estende à relação horizontal com os irmãos. Os sacramentos do batismo e da ceia apontam para essa comunhão uns com os outros. Essa união sinalizada por ambos os sacramentos é mais forte do que relacionamentos terrenos. O casamento, por exemplo, é belo e sublime, mas a morte nos desliga dessa união. A comunhão com o corpo de Cristo, todavia, não é rompida nem na morte. Até com os cristãos que já estão mortos nós temos uma ligação imperdível!
No entanto, precisamos aprender a diferenciar a comunhão com Deus da experiência deleitosa de comungar de suas bençãos. Se a morte nos impede de experimentar comunhão com os nossos irmãos em Cristo que já partiram, também é verdadeiro que há outras barreiras que prejudicam nossa experiência de comunhão (pecados pessoais, males sociais, guerras, pandemias, etc.). Isto é, a comunhão tanto vertical quanto horizontal não deixa de existir, mas a experiência da mesma é afetada. Por isso, precisamos encontrar nas Escrituras paralelos que nos permitam enxergar o que significa ter essa experiência da comunhão prejudicada.
Vejo ao menos três realidades bíblicas que nos ajudam a entender a experiência ofuscada de comunhão. Primeiramente, o exílio no Antigo Testamento suscitou a experiência do culto individual acontecendo (Dn 6.10), enquanto a realidade do culto público era anelada (Sl 137.1-6); afinal, ainda que as sinagogas tivessem surgido para instrução, não havia condições de realizar práticas próprias do templo (sacrifícios). Em segundo lugar, as cartas de Paulo exemplificam a possibilidade de realizar instrução à distância sem, contudo, experimentar todas as realidades próprias da vida eclesiástica. Há certos dons e serviços que são compartilhados presencialmente (Rm 1.9-15; 1 Ts 2.1-2) e, por isso, Paulo orientou um ato de disciplina que só a comunidade local poderia realizar (1 Co 5.3-5), além de recomendar liderança local aos coríntios (1 Co 16.15-18), um papel que ele não conseguia exercer plenamente à distância. Em terceiro lugar, até a história da redenção nos ensina que durante o tempo do pecado nós estamos usufruindo de parte da benção do Emanuel (Deus conosco), mas ainda aguardamos a plenitude que é estar na presença dEle! Isto significa que experimentamos o deleite de ter Cristo conosco de forma real, mas ainda haveremos de experimentar essa presença plenamente. Caminhamos como forasteiros e peregrinos aguardando a chegada na terra prometida.
Tendo em vista a realidade inquebrável da comunhão e a experiência ofuscada da mesma, julgo necessário que pensemos em algumas lições práticas à luz do que estamos vivendo em meio a essa pandemia:
1. Um fundamento encorajadorEstamos inseparavelmente unidos a Deus e aos seus filhos. Alegremo-nos nisso! Não há nada que pode nos tirar dessa participação. Estamos inseparavelmente unidos a Cristo e ao seu corpo e não há efeitos do pecado que consigam quebrar essa comunhão. Temos comunhão garantida com Deus e com os objetos do seu amor, para sempre e sempre!
2. Um lamento realista: Estamos momentaneamente impedidos de experimentar todos os deleites dessa comunhão. Essa é a experiência do cristão, em maior ou menor medida, durante toda a sua vida aquém da volta de Cristo. Não só é normal ficarmos entristecidos com a situação de não podermos reunir a igreja; é esperado que lamentemos esse empecilho. Se nossa alegria é estar com os nossos irmãos, podemos e devemos expressar lamento nessa hora.
3. Uma sabedoria necessária: Deus nos deu meios de experimentarmos essa comunhão. Não vamos aceitar substitutos. Não podemos achar que “culto virtual” é igual a culto presencial, assim como ver a Cristo com os olhos da fé agora não é semelhante a vê-lo em glória no porvir. Antes da pandemia, quem assistia o culto pela internet não estava cultuando juntamente com os irmãos da igreja; cultuava sozinho, mas não experimentava culto público. Por isso, não há substituto de culto público. Também não devemos celebrar ceia virtualmente – como se fôssemos neopentecostais ungindo os elementos pela televisão –, porque inclusive Cristo entendeu que ele ficaria privado de celebrar o seu sacrifício até a reunião com o seu povo naquele dia (Mc 14.25). Usemos todos os meios virtuais que nos são cabíveis agora para ensinar as Escrituras e encorajar uns aos outros à perseverança. Todavia, tais meios não devem servir como substitutos do culto público, mas apenas para despertar a ardente expectativa de que em breve nós seremos reunidos novamente.

Ainda sobre a Suspensão dos Cultos... o que fazer? Rev. Filipe Fontes



Na semana passada, escrevi um primeiro texto sobre este assunto. Meu objetivo era chamar a atenção para o quão complexo é o desafio dos líderes eclesiásticos que precisam decidir quanto à manutenção ou suspensão das atividades da igreja nestes tempos de pandemia. Meu apelo foi para que evitássemos análises e comentários simplistas, e fossemos mais misericordiosos ao tratar dessa questão.

Se você está acompanhando as discussões, deve ter percebido que elas giram, majoritariamente, em torno de uma reunião específica: o culto! Eu não vi ninguém “brigando” pela suspensão do artesanato das mulheres, do churrasco dos homens ou da pizza dos jovens no sábado à noite. Não me lembro sequer de ter visto alguém esbravejar pela suspensão da Escola Dominical. A questão tem a ver com o culto!

Há uma forte razão para isso: o culto é uma reunião singular! É quando o povo de Deus é reunido para celebrar a redenção, confessar e receber perdão, expressar unidade, ter o coração reorientado pela Palavra e responder com dedicação e disposição para o serviço. Para muito além do que minhas palavras podem expressar, se você é um cristão, você sabe o que é o culto. E sabe que a impossibilidade de cultuar costuma deixar uma sensação de vazio e de incompletude em todo cristão verdadeiro. Quando deixamos de ir ao culto, num domingo qualquer, experimentamos aquela sensação que costuma ser expressa pela seguinte exclamação: "parece que está faltando alguma coisa!"

No último domingo, os efeitos da pandemia ainda estavam começando a ser sentidos por aqui. E muitos líderes conseguiram manter o culto na igreja que dirigem. Alguns, na mesma frequência regular em que eles acontecem, e outros com uma frequência menor [foi o que aconteceu na igreja em que sirvo, por exemplo].

Mas as coisas estão piorando. À medida que o final de semana se aproxima, novas decisões precisarão ser tomadas. E eu suspeito que o número de decisões pela suspensão irá aumentar consideravelmente. Foi por isso que resolvi escrever este texto: para expressar uma preocupação e estabelecer um diálogo com meus colegas que caminharão nesta direção. Se não é o seu caso, obrigado pela leitura até aqui. Se quiser continuar, fique à vontade. Mas pode ser que não seja tão útil para você.

O grande desafio que a suspensão do culto presencial coloca sobre nossos ombros é: como conduzir o povo de Deus no culto ao Senhor, se as pessoas não podem estar presentes no mesmo ambiente? A resposta mais imediata tem sido: tecnologia, mais especificamente, internet. Foi o que boa parte das igrejas fez no domingo passado: elas reuniram um pequeno grupo e transmitiram a reunião para que aqueles que permaneceram em casa pudessem assistir [palavra usada de propósito; assistir, não participar]. Mas, se as coisas se desenvolverem como se anuncia, possivelmente isso já não será possível em alguns lugares nos próximos domingos, e o que eu creio que veremos é uma multidão de pastores falando nas redes sociais, a partir de sua própria casa, através do seu telefone celular.

A pergunta que não quer calar é: deveríamos tratar isso, naturalmente, como uma versão contemporânea do culto público? Eu acredito que não! E também acredito que se fizermos isso correremos o risco de desconsiderar a especialidade do momento que estamos vivendo, que não deve ser interpretado, por nós cristãos, apenas em termos políticos, sociais ou econômicos, mas, principalmente, em termos espirituais. Talvez, Deus esteja disciplinando a humanidade por meio desta pandemia; a Bíblia diz que Ele já fez coisas semelhantes no passado. E, talvez, a impossibilidade de nos reunirmos seja parte da disciplina do Senhor sobre nós, a sua igreja; quem sabe, pelo nosso estilo de vida individualista e nosso pouco caso para com a vida em comunidade.

Se for isso, tentar emular a experiência litúrgica comunitária através da internet, não me parece a melhor resposta. Entenda! Eu não estou dizendo que não devemos usar a internet para encurtar os espaços neste momento. Eu acredito que a internet é benção de Deus, e que ela pode ser de grande utilidade agora. O que estou dizendo é que não devemos naturalizar o extraordinário, nem alimentar a expectativa de experimentarmos, tão naturalmente, no isolamento de nossas residências, o que Deus projetou para ser experimentado no contexto da vida comunitária. A linha é tênue. Mas, por mais difícil que seja, nós precisamos considerá-la.

O que fazer então? Os princípios de liturgia de minha denominação, a Igreja Presbiteriana do Brasil, distinguem três tipos de culto: a) o individual; b) o doméstico; e c) o culto público. Baseado nessa distinção, eu suspeito que a melhor coisa a fazer na impossibilidade da realização do terceiro é estimular e prover meios para que os dois primeiros sejam intensificados. Ou seja: antes de pensar no kit youtuber para a transmissão de domingo, talvez devamos nos dedicar ao preparo e seleção de bons roteiros devocionais para que a igreja intensifique o culto individual. E também, ao preparo de um roteiro detalhado de culto doméstico que pudesse ser colocado nas mãos dos chefes de família para que eles, como sacerdotes do lar, conduzissem sua esposa e filhos na adoração. No final, pode ser que a redescoberta dessas coisas tão importantes, e ao mesmo tempo tão esquecidas, seja um efeito colateral positivo destes tempos sombrios.

Isso impede um encontro virtual para a celebração da redenção, instrução na Palavra e intercessão? De modo nenhum! Eu apenas não me sinto confortável para equivaler, naturalmente, esse encontro virtual ao encontro presencial. E, por essa razão, eu evitaria chama-lo de "culto público" ou de "culto online". Mas eu estaria lá, e além de interceder pela nação, eu intercederia por nós. Pediria que Deus fosse gracioso para conosco e estendesse ao nosso isolamento as bênçãos que Ele costuma nos dispensar no contexto da vida comunitária. Porque ao mesmo tempo em que devemos evitar naturalizar o extraordinário, precisamos nos lembrar que essas categorias são para nós, não para Ele!

O Culto Público com Transmissão na Internet? Rev. Mauro Aiello


Reluto em fazer isso na Igreja que pastoreio. Já fiz orçamentos, e me mobilizei conversando com irmãos que trabalham com esse tipo de tecnologia.

Na essência eu não considero um erro que cristãos assistam o Culto de sua Igreja na Internet. Mas é óbvio - estou me referindo a pessoas que estão impedidas de frequentar a Igreja da qual são membros. Refiro-me a irmãos acamados, pessoas idosas sem condições de locomoção, nos asilos, nos presídios, em viagens de negócios. Pode ser que haja outras razões para que alguém se veja impedido de participar dos cultos de sua Igreja e da comunhão com seus irmãos de sua comunidade. Entendo que para esses o Culto transmitido via Internet, ou qualquer outro meio similar, tem valor relativo.

Entretanto, é indesculpável, e reputo ser pecado, quem tem todas as condições para ir à Igreja e prefere ficar em casa, quem sabe, com um balde de pipoca no colo, debaixo das cobertas, vendo e ouvindo o culto da Igreja. Ou, ainda mais terrível, sintonizar o Youtube, escolher o pregador e o sermão. Eu não tenho nenhuma sombra de dúvida que isso é pecado e que agindo assim você não está adorando, essencialmente, a Deus. Se isso é preguiça, lembre-se do que disse o Proverbista: "Vai ter com a formiga, ó preguiçoso, considera os seus caminhos, e sê sábio; a qual, não tendo chefe, nem superintendente, nem governador, no verão faz a provisão do seu mantimento, e ajunta o seu alimento no tempo da ceifa. Ó preguiçoso, até quando ficarás deitado? Quando te levantarás do teu sono? Pv. 6-6-9

Não sou adepto do Culto via Internet pelas seguintes razões.

1) Porque Igreja é Comunidade. Nem toda comunidade é Igreja, mas toda Igreja é Com + Unidade, todos juntos (no mesmo lugar) tendo tudo em comum. Foi assim com Israel a Igreja do Antigo Testamento, e deve ser assim com a Igreja Cristã, o Israel da Dispensação do Evangelho de Cristo, hoje. 

Assembléia de uma pessoa não existe. E não adianta se reunir na sala com a família para ouvir o Sermão ou "Participar" do Culto pela Internet se você tem todas as condições de exercitar a comunhão, o corpo a corpo, olho no olho, lágrimas e alegrias compartilhadas. Isso é clubinho, não Igreja! Como é possível participar da Ceia do Senhor agindo assim? Como é possível ser benção ao irmão se você não convive com ele? Essa conversa de que para ser crente não é preciso ir à Igreja é maligna. Não acredite nela, porque um crente de verdade gosta de estar ao lado de seus irmãos, mormente na adoração.

2) Hoje cresce o número de "crentes" que amam a impessoalidade. Gente que tem dificuldades para se relacionar com outras pessoas. Então, ou ela se torna membro de uma mega igreja, onde ela entra sem ser vista e sai sem ser notada, ou liga o computador, ou o celular, e, usando a tecnologia, ASSISTE o Culto, sim, porque PARTICIPAR do Culto é estar com seus irmãos (de corpo presente) e juntos orarem, cantarem, ofertarem, meditarem, participar das Ordenanças (Batismo e Ceia). Leia Atos 2.42-47 e também Hebreus 12.24,25. Arrependa-se, genuinamente (mude de atitude), desse seu jeito egoísta de ser. Isso jamais poderá redundar em benção.

3) Muitos dos que optam por esse tipo de recurso são aqueles que não querem se envolver mais diretamente com a obra de Deus. Eles querem ser meros ouvintes de lindos e bem engendrados sermões pregados por PASTORES QUE NÃO OS CONHECEM. Nada contra tais pregadores. Eles são bençãos em outros contextos. Então é fácil. É só digitar, ver e ouvir o que se quer. Um sermão a la carte apresentado por um bom "garçom". O Pastor da tua Igreja, que te conhece e que de repente vai te visitar no Hospital, ou aquele que te batizou, que te ouviu pacientemente quando você atravessou por problemas no casamento, ou no trabalho, ou gasta horas a fio preparando bons sermões pertinentes à comunidade local; a esse? Bem...deixa para lá!!!! Isso não pode ser a atitude de alguém que se preocupa com a Noiva do Cordeiro.

4) Paulo não teria deixado escrito sobre os dons na Igreja, (I Cor. 12 e 13), nem sobre o zelo pela Unidade (Efésios 4.1-6), só para citar essas porções bíblicas, se ele não estivesse pensando no contato pessoal e constante entre irmãos que professam a mesma fé.

Então é bom que exista a internet, mas a Igreja In Loco é insubstituível. Peca quem abandona a comunhão ainda que assista na Internet podendo estar em contato com a fraternidade.

Pode até aparecer na telinha que esse Culto é ao Vivo, mas não acredite. Ele só é vivo para quem está lá presente, para quem o vive.

É minha convicção. É assim que eu penso e vivo.

10 Razões Contrárias à "ceia online" - Ageu Magalhães



Eu soube de uma igreja que fez a “ceia online”. Alisto abaixo 10 razões contrárias a realizar a Ceia do Senhor deste modo.

1. Falta de respaldo bíblico. Em Mateus 26, instituição da Ceia, Jesus reuniu os apóstolos e distribuiu o pão e o vinho a eles, ao redor da mesa (Mt 26.26,27). Paulo, instruindo a igreja de Corinto, condenou aqueles que tomavam a ceia antecipadamente (1Co 11.2). A ceia, refeição única em torno da mesa, é o símbolo máximo de união entre os crentes. Em Corinto os crentes não estavam fazendo isso juntos e Paulo os repreendeu: “Assim, pois, irmãos meus, quando vos reunis para comer, esperai uns pelos outros” (1Co 11.13);

2. O próprio Jesus não viu a possibilidade de uma ceia à distância. No final da instituição da ceia, sabendo que não estaria mais reunido com eles, ele disse que não beberia mais daquele vinho até o dia em que eles se reencontrassem na glória (Mt 26.29);

3. A administração da Ceia do Senhor é algo sério, tão sério que Paulo não ousou adicionar ou subtrair nada ao que Cristo havia instituído. Ele apenas repassou, com fidelidade, o que recebeu: “Porque eu recebi do Senhor o que também vos entreguei...” (1Co 11.23);

4. O Catecismo Maior, um dos símbolos de Fé da IPB, não autoriza. Na resposta à pergunta 174 do Catecismo Maior temos a prescrição de que os comungantes estejam juntos observando todos os atos sacramentais: “Exige-se dos que recebem o sacramento da Ceia que durante a sua celebração, esperem em Deus, nessa ordenança, com toda a santa reverência e atenção; que diligentemente observem os elementos e os atos sacramentais...”

5. A Confissão de Fé de Westminster também não autoriza: “Nesta ordenança, o Senhor Jesus constituiu os seus ministros para declarar ao povo a sua palavra de instituição, orar, abençoar os elementos, pão e vinho, e assim separá-los do uso comum para um uso sagrado; para tomar e partir o pão, tomar o cálice, dele participando também, e dar ambos os elementos aos comungantes, e tão-somente aos que se acharem presentes na congregação.” (Cap. 29, III) Destaco: "tão somente aos que se acharem presentes na congregação".

6. Porque a Constituição da Igreja Presbiteriana do Brasil prescreve que a administração dos sacramentos é função privativa dos ministros do Evangelho (Art. 31);

7. Porque, de acordo com os Princípios de Liturgia da IPB, o Conselho da Igreja “deve cuidar de que os membros professos da Igreja não se ausentem da Mesa do Senhor e velar para que não participem dela os que se encontrarem sob disciplina.” (Art. 14) Em uma ceia online este cuidado é impossível.

8. Porque, assim como não é possível um batismo à distância, igualmente impossível é uma ceia à distância;

9. Porque a oração de consagração dos elementos é feita sobre aqueles elementos que estão na mesa, diante da congregação, e que serão consumidos ali. Orar, via internet, consagrando os elementos que estão nas casas das pessoas se assemelha à oração de alguns pastores neopentecostais sobre o copo de água que está em cima da televisão...

10. Porque não há obrigatoriedade de a ceia ser mensal. No passado, muitas igrejas aguardavam 3, 4 meses até que o pastor pudesse chegar e ministrar a ceia. Ao invés de correr o risco de pecar gravemente contra o Senhor da Igreja, usurpando um dos seus sagrados sacramentos, o prudente é esperar o final da quarentena, que não deve durar mais 2 meses.

Aguardemos o dia feliz em que nós voltaremos a ter cultos públicos e, então, realizemos uma grande Ceia do Senhor, com alegria e pleno significado em nossos corações do que é ser igreja e do valor de estarmos juntos ao redor da Mesa do Senhor, participando do mesmo pão e do mesmo cálice!

Devemos celebrar a "ceia online"? Ageu Magalhães




Acabo de ler um artigo (aqui) de Kathy Smith , professora adjunta de política da igreja no Calvin Theological Seminary, com o título “Política da Igreja e Sacramentos Online na Igreja Reformada Cristã”. A autora defende a prática da ceia online, basicamente, com 3 argumentos: 1º Os cultos online são uma realidade entre nós agora, 2º Ceias são servidas nas casas de irmãos impossibilitados de ir à igreja e, 3º Na Segunda Guerra Mundial batismos era realizados pelos pastores nas casas das pessoas.

O texto de Kathy Smith carece de base bíblica e teológica. Nenhum texto bíblico foi citado. Sobre os 3 argumentos, vamos analisá-los:

1º Ceia online em um culto online. Culto é a reunião do povo de Deus para adorá-lo ativamente (Lv 23.3, At 20.7). As palavras bíblicas para adoração implicam serviço, atividade. Diferente da missa católica, em que o fiel assiste o padre fazer um rito, no culto bíblico o fiel participa do culto com atos de adoração. Cultuar é participar, não apenas assistir. Parar na frente de uma tela e assistir um pastor pregando não é culto. As igrejas devem criar meios de os crentes participarem do culto, seja por meio de vídeo conferências, roteiros de cultos familiares ou outra forma em que o crente não apenas assista, mas participe.

2º Ceias para impossibilitados de ir à igreja. De fato, isso tem sido feito há séculos. O entendimento bíblico é que, quando o povo de Deus está reunido, ali está a igreja. Assim, pastores costumam levar alguns crentes à casa de irmãos que não podem ir à igreja e, dentro de um culto, ministrar a Ceia. Todavia, perceba que a igreja está reunida em culto para ministração do sacramento.

3º Batismos nas casas. Totalmente possível. Desde que um pastor vá até a casa da pessoa, o batismo pode ser realizado. Na Igreja Primitiva os cultos aconteciam nas casas (Rm 16.23; 1Co 16.19; Cl 4.15; Fm 2). Se a autora tivesse defendido que as ceias ocorram nas casas, em culto, não haveria falha na sua lógica. Para o argumento dela ter validade, ela deveria ter apresentado um exemplo bíblico de batismo à distância, o que não existe.

Decisões nesta época de pandemia são complicadas. Há forte pressão sobre os pastores e presbíteros e as decisões são muito difíceis. No tocante à Ceia do Senhor, o melhor a fazer é aguardarmos o retorno ao Culto Público. Naquele dia, em alegre celebração por estarmos todos juntos, perceberemos com mais força o privilégio de reunidos, em comunhão presencial, em torno da mesa do Senhor novamente. Ansiemos por este dia.

- Kathy Smith é pastora da Christian Reformed Church in North America.

February 28, 2020

As 3 Fases da Salvação - Thiago Machado Silva


A salvação do pecado pode ser dividida em três categorias: justificação (passado), santificação (presente) e glorificação (glorificação). Nós fomos salvos, estamos sendo salvos, seremos salvos. Talvez, a maneira mais fácil de entender essas três categorias é lembrar dos três P's: penalidade, poder e presença.

1 - Justificação: Fomos salvos da penalidade do pecado
Cristo sofreu a penalidade por nossos pecados na cruz do Calvário. Quando colocamos nossa fé em Cristo, recebemos liberdade da culpa do pecado. Somos justificados diante de Deus, nosso juiz, porque nossa penalidade foi paga na cruz. A justificação ocorre uma única vez na vida do crente (Rm 8.1–2).

2 - Santificação: Estamos sendo salvos do poder do pecado
Agora que recebemos a graça de Deus como um selo permanente (2Co 1.20–22), iniciamos um processo de santificação. Estamos sendo salvos do poder do pecado pelo poder do Espírito. Antes de sermos justificados, nossas vontades estavam totalmente sujeitas ao poder do pecado. Agora, o poder do pecado está sendo quebrado. Nós, que antes éramos escravos do poder do pecado, estamos agora livres para servir a Deus. De fato, ainda pecamos, mas com o tempo aprendemos cada vez mais a escolher a santidade. Nossa santificação está em andamento.

3 - Glorificação: Seremos salvos da presença do pecado
Quando concluirmos a jornada aqui na terra, entraremos na presença do Senhor para sempre. Seremos glorificados. Em sua presença, o descanso de nossa alma será finalmente completo, pois o pecado e sua devastação deixarão de nos atacar. Embora agora estejamos cercados pela pecaminosidade, e o pecado continue se apegando aos nossos corações, um dia iremos para um lugar onde o pecado não existirá mais. Em nossa glorificação (quando Cristo retornar), finalmente teremos liberdade da própria presença do pecado. O dia da nossa glorificação está chegando, quando trocaremos a presença persistente do pecado pela presença perfeita de Deus.
Tenha certeza de sua justificação. Em Cristo, você foi totalmente liberto da penalidade do pecado. Seja paciente em sua santificação. A cada dia, você está sendo liberto cada vez mais do poder do pecado. Aguarde esperançosamente por sua glorificação. Ela está por vir. Um dia, você será finalmente liberto da presença do pecado.

February 17, 2020

8 Provas de que o Dom de Línguas de Atos 2 é o mesmo de 1 Coríntios



Antes de mais nada, esclareço que considero os pentecostais meus irmãos. Tenho comunhão com alguns deles e creio que são irmãos verdadeiros. Escrevo este texto na esperança de trazê-los a uma compreensão mais bíblica deste dom. Meu objetivo não é agredir a fé de ninguém. Eis os 8 motivos pelos quais creio firmemente que o dom de Atos 2 é o mesmo de 1 Coríntios.

1. A Sequência do dom - Não há registro bíblico que indique a mudança no dom entre Pentecostes e a Igreja de Corinto. Logo, é natural esperar que o dom exercido em Jerusalém, igreja mãe, núcleo dos apóstolos, seja o mesmo encontrado nas igrejas filhas, como é o caso de Corinto.

2. A Simplicidade da revelação - A revelação de Deus é simples. Ela alcança todos os tipos de pessoas, desde intelectuais até aqueles que não tiveram oportunidade de estudo. Por isso, alguém que começa a ler o Novo Testamento e, chegando em Atos 2, depara-se com o dom de línguas, entendendo-o como dom de idiomas, irá continuar lendo o texto sagrado com está definição em mente, a menos que o texto indique uma mudança no dom.

3. O Objetivo do dom - Qual foi o objetivo primeiro do dom de línguas? Veja Atos 2.9-11. Da boca dos estrangeiros ouvimos o cumprimento deste objetivo: ouvimos falar em nossas próprias línguas as grandezas de Deus. O objetivo era falar do Evangelho àqueles que não entediam a língua dos judeus. A grande barreira que separava aqueles homens era a língua e Deus resolveu isso através do dom. O mesmo se deu em Corinto. A barreira “idioma” caiu quando os crentes passaram a anunciar o Evangelho na língua daqueles que passavam por aquela cidade.

4. O Ambiente demográfico - Jerusalém e Corinto se assemelham em pelo menos uma coisa: a grande quantidade de estrangeiros. Na festa do Pentecostes, milhares de peregrinos de várias nações chegavam em Jerusalém para a festa. Em Corinto não havia festa, porém, por ser cidade portuária, capital da imoralidade da época e famosa pelo saber, também recebia milhares de estrangeiros em seu solo. Isto reforça ainda mais a necessidade de um dom para comunicação da Graça de Deus a estes estrangeiros.

5. A Origem gramatical da palavra - As palavras usadas para línguas tanto em Atos, quanto em Corinto, indicam linguagem humana normal. As palavras são dialektos e glossa. Ambas significam línguas, idiomas. Se Paulo quisesse se referir aos dons como linguagem ininteligível, extática, ele usaria a palavra própria para isso algaravia, nunca palavras que indicassem idiomas.

6. As línguas precisavam ser interpretadas - Em Corinto, para que todos compreendessem o que estava sendo dito aos estrangeiros, havia intérpretes capacitados pelo Espírito para a tradução. Veja 1 Coríntios 12.10; 14.5,23,26-28. Havia tradução porque eram idiomas. Idiomas podem ser traduzidos. O mesmo não acontece com linguagem sem sentido. Alguém consegue traduzir os sons de uma criança que ainda não fala?

7. A Variedade de línguas - Paulo fala em 1 Coríntios 12.10 em variedade de línguas e em 14.18 na sua capacidade de falar outras línguas. O ponto aqui é que você pode ter uma variedade de idiomas, mas não uma variedade de linguagem sem sentido.

8. As línguas eram um sinal para o Israel descrente - Em 1 Coríntios 14.21, Paulo cita Isaías 28.11,12 mostrando que as línguas são um sinal não para os justos, mas para os injustos, aqueles que não ouviram a mensagem de Deus ― o Israel incrédulo. Note que Paulo está comparando as línguas de Corinto com um idioma real e estrangeiro. Há tempos que Deus profetizava a abertura do reino aos gentios, e este texto de Isaías é justamente parte destas profecias. Visto que o povo de Deus rejeitou a sua mensagem, esta seria anunciada a povos gentios por meio de línguas estranhas à nação judaica, fato que aconteceu no Pentecostes, em Atos 2, com manifestação de idiomas.

A conclusão é que o dom de línguas bíblico é o dom de idiomas. Deus concedeu este dom à sua igreja em um momento decisivo de sua história, para pregação do Evangelho. Que Deus abençoe o povo que se chama pelo seu nome para que seja cada vez mais fiel à sua Palavra.

December 24, 2019

A Observância do Natal - Stephen D. Doe



Não há argumento contra se ter um calendário para a igreja ou a observação de “dias sagrados” no Catolicismo Romano, na Ortodoxia Oriental ou no Protestantismo em geral. É somente no ramo Reformado do Protestantismo que a questão tem sido levantada [1]. Declarando de uma forma simples, a questão é esta: nossas igrejas devem (ou podem) fazer algo especial para recordar os eventos notáveis na vida de Jesus, quando a Igreja Cristã em geral, juntamente com nossa sociedade secular, comemora aqueles eventos?

Por exemplo, um pastor deve pregar sobre o nascimento de Jesus em Dezembro, a medida que o restante da Cristandade e nossa sociedade se move para o Natal? Deve ser agendado um culto de Natal ou um culto de Sexta Feira da Paixão? Um sermão sobre a ressurreição de Cristo é apropriado no Domingo de Páscoa? Ou, estas coisas são pelo menos permitidas?

Por outro lado, negamos nossa reivindicação de sermos Reformados de acordo com a Palavra de Deus, se fizermos estas coisas que não estão ordenadas especificamente em nenhum lugar nas Escrituras? Não estamos falando sobre árvores de Natal e luzes, guirlanda e o enviar de cartões. Estamos falando estritamente sobre se a igreja de Jesus Cristo pode observar eventos particulares na vida de Jesus em datas não apresentadas na Bíblia, e se ela pode prestar culto ao seu Senhor em outros dias, além do Domingo semanal.


O Princípio Regulador

O princípio regulador de adoração é singularmente uma idéia Reformada. Ele é expresso na Confissão de Fé de Westminster (XXI:1) desse modo: “O modo aceitável de adorar o verdadeiro Deus é instituído por Ele mesmo, e tão limitado por Sua própria vontade revelada, que não deve ser adorado segundo as imaginações e invenções dos homens”. Devemos adorar a Deus do modo que Ele ordenou, e não de acordo com os nossos próprios desejos.

Tendo dito isto, devemos reconhecer que a aplicação do princípio regulador tem variado amplamente dentro dos círculos Reformados. Os Reformados continentais não têm ido na mesma direção que os Puritanos ingleses e os Presbiterianos escoceses. Por exemplo, a Segunda Confissão Helvética de 1566 declara (XXIV): “Ademais, se na liberdade cristã, as igrejas celebram de modo religioso a lembrança do nascimento do Senhor, a circuncisão, a paixão, a ressurreição e Sua ascensão ao céu, bem como o envio do Espírito Santo sobre os discípulos, damos-lhes plena aprovação”.

A velha Igreja Reformada Holandesa, no famoso Sínodo de Dort (1618-1619), adotou uma ordem para a igreja que incluía a observância de vários dias do calendário cristão (art. 67). Até hoje, é prática de muitas das igrejas Reformadas continentais usar tal calendário. Isto deve pelo menos fazer com que demos uma pausa em como procuramos aplicar o princípio regulador nestes assuntos, visto que a Igreja Presbiteriana Ortodoxa tem relações fraternais com inúmeras igrejas que seguem a Ordem de Dort.

Dentro das igrejas Presbiterianas que aderem aos padrões de Westminster, tem havido também uma considerável variação. Certamente em nossos dias há diversidade dentro e fora da Igreja Presbiteriana Ortodoxa sobre o assunto. Nada disto, certamente, prova alguma coisa, a não ser o fato de que o que os cristãos devem fazer com estes “dias sagrados” é um ponto controvertido nos círculos Reformados.


Os Argumentos contra os Dias Sagrados

Muitos dos argumentos sobre as origens destes dias se focam sobre o abuso deles na história e na sociedade atual. Contudo, argumentos baseados nos abusos não são muitos úteis, pois o mero abuso de uma coisa não nos diz se ela pode ou não ser usada corretamente. O casamento, por exemplo, está sujeito aos abusos por causa do pecado do homem, todavia, o casamento é inerentemente bom, visto que foi instituído por Deus.

Nem podemos usar a associação dos dias sagrados com a Igreja Católica Romana para resolver a questão. Os Reformadores não condenaram tudo o que a Igreja Católica disse ou fez. O batismo infantil, por exemplo, era e é praticado pela Igreja Católica Romana. Isto, por si só, não levou os Reformadores a rejeitarem o batismo infantil ou até mesmo negar que os batismos realizados nas igrejas Católicas Romanas eram válidos.

O argumento principal contra os dias sagrados é que a observância deles viola o princípio regulador de adoração, visto que sua observância não é especificamente ordenada na Bíblia. Isto poderia parecer ser um ponto irrefutável – se não fosse o fato que, como já mencionado, as igrejas Reformadas têm, no decorrer dos séculos, diferido em sua aplicação do princípio regulador neste assunto.

Deixe-me aqui também desafiar o que se tem freqüentemente dito ser um fato aceitável, a saber, que João Calvino não observou nenhum calendário cristão. T.H.L. Parker (em Calvin’s Preaching [Louisville, Ky.: Westminster, John Knox Press, 1992], pp. 160–62) organizou evidências de registros existentes para mostrar que nos anos 1549, 1550 e 1553 Calvino “quebrou” a série de sermões que ele estava então pregando e pregou mensagens especificamente sobre o nascimento de Cristo, sobre Sua morte e ressurreição, e sobre o Pentecoste nos tempos “apropriados”. Agora, o fato de João Calvino ter feito alguma coisa não significa que estamos livres para fazê-la também, se ela viola as Escrituras. Todavia, há um ponto importante aqui. A companhia dos pastores de Genebra aboliu a celebrações de festas, mas aqueles pastores, incluindo Calvino, ainda estavam livres para pregar sobre os eventos da vida de Cristo em certas ocasiões.


Liberdade Cristã

O princípio regulador deve ser interpretado como dizendo que Deus ordenou um pastor não pregar sobre certas coisas em certos períodos do ano? Isto não pode, de forma alguma, ser verdade. A igreja é ordenada a ensinar tudo o que Cristo ordenou (Mateus 28:20), e a igreja sempre entendeu que isto inclui o todo da Escritura (cf. 2 Timóteo 3:15-17; 4:2; Atos 20:27). A pregação do significado redentivo-histórico de toda a vida de Cristo é proveitosa para o povo de Deus. Uma justificativa adicional pode ser feita, a saber, que uma ênfase sobre o nascimento de Cristo se levanta quando a igreja está batalhando para defender a verdadeira humanidade de Cristo, e que a igreja hoje também enfrenta uma batalha para defender a realidade da Encarnação como um evento no tempo e no espaço. O nascimento de Cristo é parte de todo o conselho de Deus, o qual deve ser pregado.

O assunto, na verdade, é uma questão de liberdade. Esta é a questão com a qual James Bannerman lutou quando ele lidou com os “feriados eclesiásticos” (em The Church of Christ [Edinburgh: Banner of Truth Trust, 1974], pp. 406–20). A igreja tem autoridade para estabelecer certos feriados e para ordenar que pastores e assembléias os observem? A questão da imposição destas coisas era o assunto real que estava por detrás da linguagem da Confissão de Fé de Westminster. Seus elaboradores estavam acostumados com as cargas impostas em sua adoração pela Igreja da Inglaterra, que requeria tais coisas como livros de oração e vestimentas. Era a imposição de tais coisas, e não as coisas em si mesmas, que constituíam o assunto. Por exemplo, os ministros Puritanos deveriam vestir becas, mas não se eles fossem obrigados a assim fazer. Tal assunto era uma questão de liberdade cristã (cf. CFW, XXI).

A igreja tem alguma autorização para obrigar o povo de Deus a fazer algo além do Domingo semanal, quando o que se está em questão é o calendário da igreja? Não. O princípio regulador, como declarado em nossa Confissão de Fé, significa que, visto que Deus não ordenou a um pastor pregar sobre o nascimento de Jesus Cristo no mês de Dezembro, ele não pode assim fazê-lo? Não. Se eu, como um pastor, não tenho a liberdade de pregar, à partir da Palavra de Deus, o que eu vejo que seja bom para o povo de Deus, então, o princípio regulador está sendo mal aplicado. E se uma assembléia não é livre para prover ao povo de Deus uma adoração para celebrar os feitos poderosos de Deus na vida de Seu Filho em qualquer ocasião, então, nós temos limitado a igreja da nova aliança mais do que a igreja da velha aliança. A igreja exerceu sua liberdade na adoração estabelecendo a Festa de Purim (Ester 9:18-32). A igreja apostólica exerceu sua liberdade se reunindo em muitas ocasiões, além do dia do Senhor para adorar, e agindo como uma comunidade (cf. Atos 1:14; 2:42-47; 4:23-31; 5:42; 13:2; 20:7-38). Este é um antegozo da igreja na glória, onde ela estará sempre adorando (Apocalipse 4).

Deus nos ordena a adorá-lo uma vez por semana de uma maneira corporativa, mas permite que apliquemos princípios bíblicos para adorá-Lo em outros períodos. A igreja sob a nova aliança não tem menos liberdade do que a igreja sob a velha aliança; nós não somos a igreja mais jovem, mas a igreja que foi batizada no Espírito de Cristo. Se devemos aplicar o princípio regulador sem claramente entender estas coisas, então, devemos condenar a igreja apostólica por se reunir diariamente, visto que Deus nunca ordenou tais reuniões. Em vez disso, eles entenderam que o que Deus estava ordenando era que eles O adorassem de uma forma aceitável (cf. João 4:24; Romanos 12:2; Hebreus 10:25; 13:15).

Este equilíbrio é visto no exemplo do nosso Salvador, que exerceu Sua liberdade de consciência, quando não violando o princípio regulador, esteve presente na Festa de Dedicação (isto é, Chanucá; cf. João 10:22). Esta festa extra-bíblica não foi ordenada por Deus na Escritura, mas foi iniciada pelos judeus para comemorar a re-dedicação do templo, quando o Antigo Testamento já estava “fechado”. Jesus era livre para subir a Jerusalém ou não. Deus ordenou que O adoremos, e Jesus estava usando esta ocasião para obedecer o mandamento de Deus.

A igreja pode ordenar que o povo de Deus se reúna no culto de Natal? Não. A igreja pode adorar nesta ocasião sem requerer a presença de todos? Sim. Um ministro pode pregar sobre qualquer passagem das Escrituras em qualquer época do ano? Sim. Ele deve necessariamente pregar sobre a Encarnação em Dezembro? Não.


Stephen D. Doe é pastor da Igreja Presbiteriana Ortodoxa da Aliança em Barre, Vermont.



NOTA DO TRADUTOR:

[1] - Contudo, não é esta a realidade do Brasil. O ramo do protestantismo que mais tem se levantado contra o Natal e outras festas cristãs, de uma forma extremamente legalista, é o ramo pentecostal e neo-pentecostal, atribuindo tais festas não somente ao mundo, mas inclusive ao próprio diabo.

Tradução livre: Felipe Sabino de Araújo Neto
Cuiabá-MT, 18 de Dezembro de 2004.

December 10, 2019

6 razões pelas quais não precisamos de líderes de louvor no culto - Jonathan Aigner




"De muitas maneiras, o líder de música é a pessoa mais importante na liderança da grande música congregacional."

Um amigo me enviou essa citação na semana passada, e a encontrei enterrada no material promocional de algo chamado "Word in Song", organizado por um grupo chamado Emu Music. Uma olhada na guia "Quem somos" revela que esse grupo é predominantemente anglicano. Tenha isso em mente. Não estamos falando de muitos discípulos de Hillsong ou evangélicos quase carismáticos aqui.

Naturalmente, como alguém que acredita de todo o coração que toda igreja cristã deve ser uma igreja que canta, essa citação e sua fonte me fizeram tremer. Há muito tempo é óbvio que, à medida que a sociedade moderna passou de fazer música a consumir música, a igreja livremente seguiu o exemplo. Mas cada vez mais a igreja litúrgica também está se rendendo aos padrões da música pop comercial. E um de seus princípios centrais é que você deve ter alguém cantando ao microfone. Você tem que ter um líder de música.

Aqui estão algumas razões pelas quais devo discordar.

1. Leva as pessoas ao consumo de música, e não à participação.

Durante minha última visita ao consultório do dentista, minha higienista me perguntou o que eu fazia. Depois que terminei de enxaguar e cuspir, disse a ela que era diretor musical da igreja. Como geralmente acontece quando as pessoas não entendem música sacra, ela me contou tudo sobre sua igreja, que naturalmente se encontra em um supermercado convertido. Aparentemente, seu pastor tocou uma vez na banda de Tommy Lee. Não, não Mötley Crüe, uma de suas outras bandas igualmente horrível, mas menos conhecida.
  
“Então, como esperado, nosso pastor realmente garante que nossa adoração seja incrível. É como um show de rock toda semana. "

"Sim, é quase o que eu esperava", eu disse.

A igreja que cultua não consome música, ela faz música. Mas o conceito moderno de vocalista veio da música pop comercial, escrita para um solista ou um pequeno grupo. Não é de admirar, então, que a maioria dos cultos pop ao vivo soa bastante semelhante à sala de shows. Um "líder" que canta com inflexão pop e tom afetado, enquanto inventa e improvisa ritmo e melodia, não pergunta a uma congregação: "Cante comigo". Ele diz: "Aborde o canto congregacional como se fosse um show".

2. Amplificação suprime o canto congregacional.

Um líder solo que canta com microfone envia uma mensagem à congregação de que seu papel é semelhante ao de uma platéia em um show de rock: "Cante se você quiser, mas isso realmente não importa". Como resultado, a natureza corporativa do culto reunido e a voz da congregação se torna completamente dispensável para tudo. Embora alguns possam estar cantando, às vezes até em voz alta, a função da congregação é mais passiva do que ativa.

3. O órgão é um líder melhor.

Muitas pessoas, especialmente os líderes de música, dirão que essa é simplesmente a minha opinião. Não creio. E embora muitos também apontem alguns exemplos históricos de órgãos que são proibidos em algumas igrejas, eles geralmente não reconhecem que o órgão de tubos realmente se desenvolveu dentro da igreja a serviço das necessidades litúrgicas da igreja.

O instrumento em si é inigualável em sua capacidade de permitir um bom canto congregacional. O órgão pode sustentar arremessos sem decaimento, conduzindo as frases, atraindo a música para fora da congregação. A articulação precisa no console pontua a frase para a congregação, respirando com eles e acompanhando a frase a seguir. Um órgão com boa voz e tamanho para a sala enfatizará as partes inferiores e superiores do tom, deixando espaço no meio para que as vozes humanas se encaixem. E, embora possa fornecer uma estrutura musical de apoio para encorajar os cantores, não pode cantar o texto para eles.

4. Cantores com microfones tendem a falar.

A pior teologia acontece na adoração quando saímos do script e, juntamente com o fato de que a maioria (mas certamente não todos) dos chamados "líderes de adoração" não são bem treinados teologicamente, mesmo as declarações planejadas tendem a ficar aquém da boa teologia ou significativa conexão com a liturgia. Mesmo se eles são treinados teologicamente, os tempos corporativos de oração cantada tradicionalmente usam linguagem refinada e elevada, temperada por séculos, impregnada nas Escrituras e na teologia. Não é hora de jogar um monte de balbúrdia extemporânea, que pode ser nada menos que desastrosa.

5. O líder de música frequentemente se torna uma vitrine para ego e personalidade.

Estamos vivendo os dias da celebridade cristã. Como eu disse antes, testemunhamos o advento da "estrela de adoração", especialmente nas últimas duas décadas. Conceder um microfone a um músico está oferecendo a eles muita força e prestígio. Alguns transformam o culto corporativo em uma rotina de comédia com humor e carisma. Alguns aproveitam a oportunidade para mostrar seus próprios estilos pop afetados e construir sua celebridade no molde de tantos outros. Alguns exploraram a vulnerabilidade de uma congregação emocionalmente comprometida. Basta olhar para as vendas de discos da chamada "indústria de adoração". Mesmo aqueles que se esquivam do título de "superstar", bem, eles podem realmente negar que é isso que eles são?

A chamada "indústria do culto" exacerbou esse fenômeno. Como nossa cultura está muito acostumada a ouvir música para entretenimento, criamos nossas próprias celebridades. Não se engane sobre isso. A igreja também faz isso. Começamos a associar o culto a uma pessoa e a uma apresentação, em vez da oração corporativa por meio da Palavra e do Sacramento.

6. A música tradicional da igreja praticamente canta a si mesma.

Temos uma rica história de salmos, hinos, canções e canções, criadas com belas melodias eminentemente cantáveis, com uma rica estrutura harmônica, um grupo ao qual cada geração acrescentou o melhor. Então decidimos que não precisávamos mais dessas coisas. Então substituímos nossos hinos por novas músicas, escritas para gravações comerciais solo.

E foi aí que decidimos que precisávamos de um líder de música, com uma banda cover de alto nível.

Mas nós não. Nós nunca fizemos. Nós apenas precisamos cantar.

Vamos continuar

Estou pronto para superar líderes de música no culto. Estou pronto para sair do ataque musical amplificado. A igreja deveria estar também, e é hora de se auto-corrigir.

Precisamos ensinar nossas congregações a cantar, e não apenas ter alguém com microfone cantando.



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