A questão da
propriedade das representações pictóricas do Salvador merece ser examinada.
Deve ser concedido que o culto de Cristo é central em nossa santa fé, e o
pensamento do Salvador deve, em toda instância, ser acompanhado com aquela
reverência que pertence ao seu culto. Não podemos pensar nele sem a apreensão
da majestade que é sua. Se nós não acolhemos o senso da sua majestade, então,
somos culpados de impiedade e de desonrar o seu nome.
Deve também ser
lembrado que o único propósito que pode ser servido por uma representação
pictórica de maneira apropriada é que ela deve trazer a nós algum pensamento ou
lição representada, consoante com a verdade e visando promover o culto. Desde
já a questão é inescapável: a representação pictórica é um meio legítimo de
conduzir a verdade e de contribuir para o culto que essa verdade deve evocar?
Estamos todos alertas
quanto à influência exercida sobre a mente e o coração pelas imagens. Imagens
são poderosos meios de comunicação. Quão sugestivas elas são ou para o bem ou
para o mal e tudo o mais quando acompanhadas pelo comentário da palavra escrita
ou falada! É fútil, entretanto, negar a influência exercida sobre a mente e o
coração por uma imagem de Cristo. E se tal é legítimo, a influência exercida
deve ser constrangedora para o culto e adoração. Afirmar qualquer desígnio mais
baixo como que servido por uma imagem do Salvador seria uma contradição do
lugar que ele deve ocupar no pensamento, afeição e honra.
O argumento para a
propriedade das imagens de Cristo é baseado sobre o fato de que ele era
verdadeiramente homem, que tinha um corpo humano, que era visível em sua natureza
humana para os sentidos físicos, e que uma imagem nos ajuda a tomar uma
estupenda realidade da sua encarnação, em uma palavra, que ele foi feito
semelhança de homens e foi encontrado em forma humana.
Nosso Senhor teve um
verdadeiro corpo. Ele poderia ter sido fotografado. Um retrato poderia ter sido
feito dele e, um bom retrato, reproduziria a sua semelhança.
Sem dúvida os
discípulos nos dias da sua carne tinham uma vívida imagem mental da aparência
de Jesus e eles não poderiam deixar de ter retido esta recordação até o fim de seus
dias. Eles nunca poderiam reter o pensamento nEle, pensar em como Ele peregrinou
ao seu lado sem algo daquela imagem mental e não poderiam tê-la sem adoração e
culto. As verdadeiras características que eles lembravam seriam parcela
integrante da sua concepção acerca dEle, as reminiscências do que Ele foi para
eles em sua humilhação e na glória da aparência da sua ressurreição. Muito mais pode ser dito a respeito do significado das características físicas de Jesus
para os discípulos.
Jesus também está
glorificado no corpo e esse corpo é visível. E também se tornará visível a nós
em seu glorioso aparecimento: “aparecerá segunda vez, sem pecado, aos que o
aguardam para a salvação” (Hebreus 9.28– ARA). O que, então, podemos dizer das
imagens de Cristo? Primeiro de tudo, é preciso dizer que não temos quaisquer
dados como base para fazer uma representação pictórica de Jesus; não temos
descrições das suas características físicas que permitiriam ao artista mais
habilitado fazer um retrato aproximado. Em vista da profunda influência exercida
por uma imagem, especialmente nas mentes das pessoas jovens, devemos perceber o
perigo envolvido em uma representação para a qual não existe nenhuma garantia,
uma representação que é a criação da pura imaginação. Ela pode ajudar a
destacar a tolice de perguntar: qual seria a reação de um discípulo, que realmente
viu o Senhor nos dias da sua carne, diante de um retrato que seria obra da
imaginação de alguém que nunca viu o Salvador? Podemos detectar facilmente qual
seria a sua repulsa.
Nenhuma impressão que
temos de Jesus deve ser criada sem os dados próprios da revelação, e cada
impressão, cada pensamento, deve evocar o culto. Assim, visto que não possuímos
dados revelacionais para uma imagem ou retrato no sentido próprio do termo, estamos
impedidos de fazer uma ou de usar qualquer uma que tenha sido feita.
Em segundo lugar, as
imagens de Cristo são, em princípio, uma violação do segundo mandamento. Uma
imagem de Cristo, se serve a algum propósito útil, deve evocar algum pensamento
ou sentimento a respeito dEle, e em vista do que Ele é, esse pensamento ou
sentimento será de adoração. Não podemos evitar fazer da imagem um meio de
culto. Porém, desde que os materiais para esse meio de culto não são derivados
da única revelação que possuímos a respeito de Jesus, ou seja, as Escrituras, o
culto é coagido por uma criação da mente humana que não tem garantia
revelacional. Esse é o culto de si mesmo [i]. Pois o princípio do segundo
mandamento é que adoramos a Deus apenas pelos meios prescritos e autorizados
por Ele. É um grave pecado cultuar coagido por uma invenção humana, e isso é o
que uma imagem do Salvador envolve.
Em terceiro lugar, o
segundo mandamento proíbe curvar-se a uma imagem ou semelhança de qualquer
coisa em cima no céu, ou embaixo na terra, ou na água debaixo da terra. Uma
imagem do Salvador pretende ser uma representação ou semelhança dEle que agora
está no céu, ou, pelo menos, dEle quando peregrinou na terra. É claramente
proibido, portanto, prostrar-se diante de tal representação ou semelhança. Isso
expõe a iniquidade envolvida na prática de exibir representações pictóricas do
Salvador em locais de culto. Quando cultuamos diante de uma imagem do nosso
Senhor, quer seja na forma de um mural, ou em tela, ou em vitrais, estamos
fazendo o que o segundo mandamento expressamente proíbe. Isso se torna ainda
mais evidente se tivermos em mente que a única razão pela qual uma imagem dEle
deveria ser exibida em um lugar é a suposição de que ela contribuiria para o
culto daquele que é o nosso Senhor. A prática apenas demonstra como quão
insensíveis prontamente nos tornamos aos mandamentos de Deus e às incursões da
idolatria. Possam as igrejas de Cristo estarem despertas quanto aos expedientes
enganosos pelos quais o arqui-inimigo sempre procura corromper o culto do
Salvador.
Resumindo, o que está
em jogo nessa questão é o único lugar que Jesus Cristo como o Deus-homem ocupa
em nossa fé e culto e o único lugar que a Escritura ocupa como a única
revelação, o único meio de comunicação, a respeito daquele a quem cultuamos
como Senhor e Salvador. A Palavra encarnada e a Palavra escrita são correlativas.
Não ousemos usar outros meios de impressão ou de sentimento, mas aqueles da sua
instituição e prescrição. Cada pensamento e impressão dEle devem evocar culto.
Nós O adoramos com o Pai e o Espírito Santo, único Deus. Usar uma semelhança de
Cristo como um auxílio ao culto é proibido pelo segundo mandamento tanto quando
é proibido em relação ao Pai e ao Espírito.
(Reimpresso do Reformed
Herald, Vol. XVI, nº 9. Fevereiro de 1961).
TRADUÇÃO LIVRE: Alan Rennê Alexandrino Lima
[i] NOTA DO
TRADUTOR: Em Colossenses 2.23, o apóstolo Paulo usa essa expressão para falar
do culto baseado apenas na vontade humana. Trata-se de uma adoração originada
do coração, não das Escrituras.
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