30 30UTC Julho 30UTC 2009 por
Hugo Se você aí no Brasil ainda não conhece Rob Bell, vai acabar conhecendo. Bell é o pastor de uma mega-igreja em Grand Rapids, Michigan, EUA, chamada
Mars Hill Bible Church (
Mars Hill é a tradução em inglês da palavra Areópago – lugar onde Paulo pregou aos gregos – Atos 17). Fundada em 1999, quando Bell tinha 28 anos de idade, a comunidade pastoreada por ele e por sua esposa Kristen conta hoje com mais de 10.000 membros. Seu estilo de ensino, moderno e cativante, é a marca registrada de seu ministério e é certamente responsável por seu extraordinário crescimento numérico. Três de seus livros já foram traduzidos para o português:
Repintando a Igreja, Deus quer Salvar os Cristãos e
Sex God (ainda não lançado, mas já no prelo de impressão da Editora Vida). Bell já possui uma legião de admiradores no Brasil, entre eles o liberal
Ricardo Gondim e seu amigo Ed René Kivitz.
No vídeo a seguir, intitulado “As Boas Novas de Acordo com Rob Bell”, Bell nos oferece sua versão daquilo que ele entende como as boas novas de Deus ao mundo:
Para alguns, Bell é o Billy Graham da juventude americana. De fato, Bell tem o potencial de se tornar no Youtube e outras formas de mídia eletrônica aquilo que Graham foi nos estádios – pelo menos em termos de alcance, inegável entre os jovens, muitos dos quais jamais colocariam os pés em uma igreja tradicional. Não assistí toda sua série de vídeos intitulada
Nooma (representação fonética em inglês da palavra grega
pneuma – que quer dizer sopro ou espírito), mas os vídeos que vi me impressionaram tanto na produção, impecável e profissional, quanto no conteúdo. Bell não é somente um mauricinho que gosta de aparecer. Ele realmente ensina. Sua habilidade como mestre é evidente (o que de forma alguma testifica a favor de sua mensagem).
Sem dúvida nenhuma, Bell é um gênio no quesito “contextualização”, e o admiro por isso. A geração atual não suporta mais o estilo ultrapassado e o dialeto religioso dos “irmãos”. Bell se despiu de toda religiosidade: ele se veste, fala e ensina no mesmo nível de sua geração. Seus ensinamentos são práticos e acessíveis, sem “teologiquês” nem “evangeliquês”. Bell se livrou do estilo tradicional de “louvor + sermão” em seus cultos. Em uma linguagem não religiosa, ele comunica princípios à sua audiência a partir de elementos do dia a dia e da cultura, semelhante ao que Jesus fazia quando contava parábolas à sua audiência.
Mas apesar de tudo isso, certas coisas me causam um desconforto terrível quando leio ou assisto Rob Bell. A forma e o estilo como ele projeta suas idéias são deveras fascinantes. Entretanto, o problema está em alguns sutis elementos que fazem parte de sua mensagem e que passam despercebidos na lupa de muitos de seus leitores, fascinados por seu elegante estilo literário e seu clamor em favor dos menos favorecidos.
Evangelho sem Cruz
Rob Bell é um dos chamados “emergentes liberais”. Para tais, o compromisso doutrinário é uma atitude beligerante e certos dogmas são desnecessários à fé cristã. O que importa para o emergente liberal é uma vida de serviço ao próximo, para assim “tornarmos o mundo um lugar melhor”. Mas assim como canja de galinha não é mais canja se não tiver frango, feijoada não é mais feijoada se não tiver feijão e suco de uva não é suco de uva se não tiver uva, um evangelho desprovido de certos elementos essenciais já não é mais o Evangelho pregado por Cristo e seus apóstolos.
Bell menciona a ressurreição de Cristo no vídeo, mas seguindo a tendência liberal pós-moderna, não menciona a cruz de Cristo. A exemplo de seu mentor Brian McLaren (que afirma que a cruz é uma
propaganda enganosa do evangelho), Bell se esquiva do escândalo da cruz. Ele simplesmente omite o tema e quando o menciona, não aborda a crucificação como o evento no qual Deus expiou os pecados da raça humana pelo sacrifício de seu Filho. Em
Jesus Quer Salvar os Cristãos, por exemplo, Bell menciona a crucificação, mas dilui seu caráter expiatório e ressalta a atitude pacífica de Jesus, que não resistiu a seus agressores e caminhou a milha extra com eles. Jesus deixa de ser o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo e redime com seu sangue, para tornar-se
somente um exemplo de pacifismo e auto-negação.
Até mesmo quando fala da ressurreição, Bell é ambíguo. No vídeo acima, ele menciona a ressurreição não como um evento místico, ou seja, a ressurreição corporal para a vida eterna (compreensível, porque, a ênfase do evangelho de Bell se limita a “fazer deste mundo um lugar melhor” e não aborda questões como o julgamento dos ímpios e a herança dos santos no mundo porvir; uma ressurreição literal perde totalmente seu valor). Bell prega uma ressurreição alegórica que se dá
pela perpetuação da “ideologia cristã” através do pacifismo e pelo serviço ao próximo. Em outras palavras, Jesus está vivo entre nós quando levamos adiante sua missão de tornar este mundo um lugar melhor.
O “Plágio” Judaico-Cristão
Bell é adepto do
desconstrucionismo pós-moderno, que questiona muitas das doutrinas e dogmas defendidos pelo cristianismo ortodoxo. O desconstrucionismo pós-moderno nem sempre é uma refutação aberta aos pilares doutrinários do cristianismo. É muitas vezes um tapinha com luva de pelica, algo muito sutil, que bate no fundamentalismo bíblico na forma de questionamentos.
No movimento emergente liberal, influenciado pela filosofia pós-moderna, ao invés de fornecer respostas, a moda da vez é lançar dúvidas sobre postulados estabelecidos. Tudo é subjetivo, nada é absoluto, além daquilo que eles entendem como “amor ao próximo”.
Um exemplo disso é a insistência de Bell em comparar as raízes judaico-cristãs da Igreja com lendas e costumes pagãos do Império Romano e da Antiguidade. Ele o faz no vídeo acima de forma extensiva, o fez em seu livro “Repintando a Igreja” e o faz sempre que tem a oportunidade.
Esta insistência soa quase como uma sugestão de que toda a narrativa judaico-cristã foi nada mais do que um plágio das superstições de Antiguidade.
Bell reconta o evangelho no vídeo acima como se fosse uma mera lenda deste “grupo de judeus que alegam terem visto seu rabino ressurreto” (para usar suas próprias palavras). Esta
ambiguidade e o sutil jogo de palavras no discurso acima me incomodam (eu diria que talvez minha veia fundamentalista está falando alto demais, se não conhecesse a visão distorcida que Rob Bell tem das Escrituras). Bell fala de forma apaixonada quando descreve a missão da Igreja (que supostamente é transformar o mundo em um lugar melhor), mas
a imparcialidade apática de sua retórica quando toca em certos pontos, como o nascimento virginal de Cristo, a crença em Jesus como o Filho de Deus, sua ressurreição e ascenção aos céus (repetidamente comparando tais crenças com mitos e práticas pagãs), mais se assemelha com a de um jornalista que se limita a transmitir uma estória sem necessariamente expressar sua opinião ao dizer se a mesma é real ou somente uma lenda.
É como se pudéssemos ouvir a Serpente, ao longo da narrativa Bell, perguntando de forma bem sutil: “Será que essa estória é mesmo verdadeira ou não passa de uma lenda?”
Um outro exemplo está na página 26 de seu livro
Velvet Elvis – Repainting the Christian Faith (no Brasil publicado com o título “Repintando a Igreja”), onde Rob Bell compara o nascimento virginal de Cristo com a lenda de Mitra (como no vídeo acima). Bell diz que a palavra “virgem” usada por Mateus pode ser traduzida como “jovem moça” e que se Jesus tivesse um pai biológico chamado Larry, a fé cristã em nada seria afetada, pois supostamente o que importa é a maneira que vivemos. Bell não nega abertamente o nascimento virginal, mas além de lançar dúvidas sobre o fato, anula totalmente sua relevância.
Será que este pequeno fato não tem nenhuma relevância? Pensemos: se Jesus tivesse um pai terrenal, as Escrituras estariam mentindo quando afirmam que José não teve relações com Maria até um tempo depois que Jesus nasceu. Se Mateus 1:25 não mente, então a mãe de nosso Senhor teria sido uma adúltera e fornicadora. Inevitavelmente, tal questionamento fere uma das duas premissas: ou a Bíblia não é infalível ou a mãe de nosso Senhor não era uma mulher descente. Ainda que seja verdade que no hebraico a palavra “virgem” é sinônimo de “jovem moça”, o contexto de Mateus nos deixa bem claro o que o evangelista quis realmente dizer.
Se Jesus era filho de José, de Larry ou qualquer outro homem, então toda a retórica de Paulo acerca do segundo Adão e uma nova raça não passaria de uma sandice (1 Cor 15:45 em diante).
As Influências de Rob Bell
Os Bell começaram a questionar seus próprios conceitos a respeito da Bíblia – “descobrindo a Bíblia como um produto humano”, nas palavras de Rob, ao invés de um produto divino. “A Bíblia ainda é o centro para nós”, diz Rob, “mas um tipo diferente de centro. Queremos abraçar o mistério ao invés de conquistá-lo.”
“Cresci pensando que entendia a Bíblia”, diz Kristen, “que sabia o que ela queria dizer. Agora, não tenho a menor idéia do que ela quer dizer.”
Fonte: Brian McLaren
Não quero promover a temporada de caça às bruxas, mas é importante que você, que lê as obras de Rob Bell, saiba que ele e sua esposa negam abertamente a inspiração e a inerrância das Escrituras.
A emergência liberal é um processo de desaprendizado bíblico, no qual deixamos de entender a Bíblia como o veículo por meio do qual Deus expressa sua vontade absoluta de forma clara, para vê-la como um conjunto de rabiscos humanos do qual podemos até extrair algumas coisas, desde que não se trate de algo muito absoluto – seguindo a tendência pós-moderna niilista de abraçar o subjetivo, negar valores absolutos, de evitar ver as coisas “preto no branco”, de ter respostas prontas.
Crendo-se muito sábios, os emergentes liberais se tornaram loucos, adeptos de um masoquismo intelectual que prefere dúvidas a certezas.
E como ninguém interpreta a Bíblia a partir do vácuo, mas inevitavelmente reflete em sua análise alguma influência, seja teológica ou cultural, devemos perguntar quais são as fontes de Rob Bell. A resposta não é tão difícil.
As ideias de Bell tendem à heresia conhecida como
neo-ortodoxia bartiniana. Karl Barth ensinava o universalismo (algo que os emergentes liberais abraçam) e que as Escrituras apenas se tornam a Palavra de Deus por meio da obra do Espírito Santo em cada indivíduo, de forma subjetiva. Em outras palavras,
a Bíblia não é divinamente inspirada, a não ser que Deus decida usá-la para falar com o indivíduo (assim como faz quando fala conosco por meio de um filme ou de uma notícia de jornal).
Em uma nota de rodapé, na página 184 de seu livro
Velvet Elvis – Repainting the Christian Faith (Repintando a Igreja), Rob Bell cita como uma de suas referências o teólogo Marcus Borg e sua obra
The Heart of Christianity (O Coração do Cristianismo)
. As citações a seguir foram retiradas da página 45 da obra de Borg citada por Bell:
A Bíblia é o produto de duas comunidades históricas: Israel antigo e o movimento cristão primitivo. […]
Como tal, é um produto humano, não divino. […]
A Bíblia descreve a maneira como estas comunidades antigas responderam a Deus … a Bíblia nos relata a maneira como eles viam as coisas […] Não é o testemunho de Deus acerca de si mesmo (não é um produto divino), mas o testemunho destas pessoas diante de Deus.
Como produto humano, a Bíblia não é a “verdade absoluta” ou a “verdade revelada de Deus”, mas é relativa e condicionada à cultura … a Bíblia nos diz como nossos ancestrais espirituais viam as coisas – não como Deus as vê.
Pergunto àqueles que acompanham Rob Bell:
a linguagem de Borg lhes soa familiar?
As impressões digitais de Borg estão por todos os lados nas obras de Rob Bell e de seu mentor Brian McLaren (autor de
Ortodoxia Generosa e
A Mensagem Secreta de Jesus),
obras estas que Ricardo Gondim endossa e aparentemente têm como referência (o que não é nenhuma supresa). Suas idéias estão em gritante contraste com o que Paulo nos diz acerca das Escrituras;
Toda Escritura é divinamente inspirada e proveitosa para ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em justiça; para que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente preparado para toda boa obra. (2 Tim 3:16-17)
Conclusão
O tipo de “evangelho” apresentado no vídeo acima é uma versão adulterada do Evangelho apostólico que prega Cristo crucificado para a redenção da raça humana. É uma adaptação que dilui o chamado apostólico ao arrependimento em uma mera filosofia pacifista centrada na prática de boas obras e demonstração de amor ao próximo.
Ainda que elementos como pacifismo, auto-negação e amor sacrificial na forma de boas obras sejam elementos importantes do verdadeiro Evangelho, esta não é a essência do Evangelho genuíno.
A essência do verdadeiro Evangelho é que o homem, intrinsicamente depravado, foi redimido por Cristo, por meio de seu sacrifício expiatório na cruz do Calvário. Com “sacrifício expiatório”, entende-se que Jesus tomou nosso lugar na morte e na condenação pelas quais que eu e você deveríamos ter passado. Entendendo isso, e somente a partir daí, é que, mediante o arrependimento de nossas obras mortas, morreremos para nossa velha natureza e seremos transformados de glória em glória à imagem do Filho de Deus, para que possamos caminhar em novidade de vida neste mundo. E apesar de a glória do Filho de Deus em nós nos impulsionar a servir nosso próximo, tal demonstração de amor não se limita a “fazer do mundo um lugar melhor” (como Bell afirma no vídeo).
O mesmo amor com o qual aliviamos o sofrimento dos menos favorecidos deste mundo, deve tornar-nos arautos de um mundo porvir que será herdado por aqueles que ressuscitarem para a Vida Eterna, e também do julgamento dos ímpios.
A visão que Bell tem das Escrituras Sagradas (como uma obra que representa a visão de seus escritores e não a verdade absoluta de Deus) somada à forma ambígua na qual ele narra a vida de Jesus – insistentemente comparando o nascimento virginal de Cristo, sua posição como Filho de Deus e sua ressurreição corporal a mitos e práticas pagãs – me faz questionar a cristologia de Rob Bell. Afinal, se as Escrituras não se constituem na Palavra escrita inspirada por Deus, então coisas como “nascimento virginal”, “Filho de Deus” , “ressurreição” e “ascenção aos céus” na cabeça de Bell podem realmente ser somente uma força de expressão, uma figura de linguagem influenciada pela superstição, pela mitologia e pela idolatria aos césares da época. Talvez, na cabeça de Bell, a maneira como a Bíblia descreve Jesus seja somente “uma pintura da forma que os primeiros discípulos enxergavam as coisas.”
Digo “talvez”, caro leitor, porque penso que ninguém pode saber com certeza o que pensa Bell e outros emergentes liberais a respeito de algumas coisas.
A característica principal do espírito que está por traz do liberalismo emergente é deixar certas coisas “no ar”, para que sejam interpretadas individualmente. Afinal, de acordo com a filosofia pós-moderna que influencia a mente destes líderes, “nunca há somente uma resposta possível” e a verdade é algo relativo.
Tudo isso nos leva e pensar que
se Jesus fosse um homem comum, nunca houvesse ressuscitado ou sequer existido – e tudo não passasse de uma lenda plagiada de Roma Antiga – para Bell e seus seguidores não haveria problema algum, pois o que importa realmente são os ensinamentos que este Cristo “lendário” nos deixou e sua prática de “amor ao próximo” (!!!). O liberalismo emergente transformou o Evangelho em uma mera filosofia e reduziu o Filho de Deus a um filósofo, na melhor das hipóteses, ou a uma mera lenda, na pior delas.
A mensagem sublimar por trás do liberalismo emergente é somente uma, e não é difícil de ser decifrada. Abaixo, a compilação dos sutis elementos que cada vez mais caracterizam o diálogo emergente, a saber: o liberalismo teológico, o universalismo e a prática de boas obras como substituição à mensagem da cruz:
“
A Bíblia não transmite verdades absolutas. Então, não importa quais fatos da narrativa bíblica são realidades e quais são meras projeções das opiniões ou superstições de seus autores. O importante mesmo são alguns valores que podemos dela extrair, a saber: O Evangelho é a boa nova de que Deus quer tornar este mundo em um lugar melhor. O Evangelho é nada mais do que um conjunto de bons valores morais, éticos e sociais que devem ser perpetuados e compartilhados pela prática do pacifismo, da auto-negação e do amor ao próximo. Quando fazemos estas coisas, Cristo está vivo entre nós – esta é a ressurreição. A única diferença entre budistas, hindus, muçulmanos, cristãos e até mesmo incrédulos de boa índole é que os cristãos personificam estas boas novas na lenda do Filho de Deus. Mas o que importa realmente é o amor, porque Deus é amor.”
Este é o mesmo “evangelho” de obras contra o qual os reformadores tanto lutaram, com a diferença de que, em sua nova versão, não agradamos a Deus pela compra de indulgências, mas pela prática de boas obras. Tal mensagem é a amostra de uma forma de piedade que nega o poder de Deus (2 Tim 3:5). É morte na panela, é apostasia.
Quem vos fascinou para não obedecerdes à verdade, a vós, perante os olhos de quem Jesus Cristo foi evidenciado, crucificado, entre vós? (Gal. 3:1)
Fonte deste post: http://paoevinho.wordpress.com/2009/07/30/o-evangelho-diludo-de-rob-bell/